Justiça dos EUA mantém bloqueio a deportações feitas sob pretexto de lei de guerra

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GUILHERME BOTACINI
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

A segunda instância da Justiça dos Estados Unidos manteve nesta quarta-feira (26) a decisão de um tribunal federal que bloqueou temporariamente a deportação de imigrantes venezuelanos pelo governo de Donald Trump com base em uma lei de guerra do século 18.

A decisão do tribunal de apelações da capital americana é uma derrota para o presidente republicano, que tem criticado a decisão do juiz federal James Boasberg e atacado o magistrado. Trump e seus aliados dizem que o bloqueio é uma invasão do Judiciário em competência do Executivo.

Ainda cabe recurso, que seria analisado pela Suprema Corte do país, onde há uma maioria conservadora construída por indicações de Trump no seu primeiro mandato.

Um painel de três juízes do tribunal de apelações votou, com resultado 2 a 1, para manter o bloqueio de Boasberg às deportações. O magistrado Justin Walker, nomeado por Trump durante seu primeiro mandato, foi o voto contrário.

Trump invocou a Lei de Inimigos Estrangeiros, de 1798, no dia 15 de março para deportar supostos membros da gangue venezuelana Tren de Arágua, sem o devido processo legal relativo a deportações -que exige uma ordem judicial de deportação para cada indivíduo removido.

A última vez que a legislação, que permite a deportação acelerada de estrangeiros em tempos de guerra, havia embasado deportações foi durante a Segunda Guerra Mundial, contra imigrantes japoneses, italianos e alemães.

Alguns voos ocorreram a despeito do bloqueio do juiz Boasberg, que emitiu sua ordem horas depois do início do processo de deportação -os imigrantes, 238 venezuelanos e outros salvadorenhos, foram levados para El Salvador e levados à prisão de segurança máxima Cecot. Autoridades do governo americano disseram que a ordem foi emitida quando aviões já estavam no ar, e que, portanto, não poderiam retornar as aeronaves.

O que se seguiu foi o início de uma disputa judicial em torno da questão, que ganhou contornos políticos em críticas feitas por Trump.

Bloqueados temporariamente os voos, o juiz Boasberg abriu processo para determinar não apenas o mérito da suspensão dos voos, mas também se o governo desobedeceu sua ordem ao dar continuidade aos voos no dia em que a ordem foi dada.

Durante a semana, Trump e aliados, como o bilionário Elon Musk, pediram o impeachment de Boasberg.

O republicano chamou o juiz de “lunático radical de esquerda”. Em rara manifestação crítica, o presidente conservador da Suprema Corte, o juiz John Roberts, afirmou que “por mais de dois séculos ficou estabelecido que o impeachment não é uma resposta apropriada para desacordos sobre uma decisão judicial”.

Familiares de muitos dos migrantes venezuelanos deportados negam os supostos laços com gangues.

Advogados de um dos deportados, um jogador de futebol profissional venezuelano e treinador de equipes juvenis, disseram que as autoridades dos EUA o rotularam erroneamente como membro de gangue com base em uma tatuagem de uma coroa destinada a homenagear seu time favorito, o Real Madrid.

A juíza Patricia Millett, da corte de apelações que manteve o bloqueio dos voos, nomeada pelo ex-presidente Barack Obama, afirmou que o gestão não estava dando aos migrantes a chance de contestar a afirmação do governo de que eram membros do Tren de Arágua antes de deportá-los.

Já a juíza Karen Henderson, nomeada pelo ex-presidente George H. W. Bush, disse que não estava claro que a presença do Tren de Arágua nos EUA constituía um ato de guerra conforme contemplado pela Lei de Inimigos Estrangeiros. A gestão Trump defende que sim, classificando o grupo criminoso de terrorista e afirmando que a gangue comete atos de desestabilização do país.

“Uma invasão é um assunto militar, não de migração”, escreveu a juíza Henderson.
Drew Ensign, advogado do governo, argumentou no início desta semana, ao instar o tribunal de apelações a suspender a ordem de Boasberg, que o juiz não tinha o direito de questionar a decisão do presidente em assuntos de política externa.

A secretária de Segurança Interna dos EUA, Kristi Noem, chegou nesta quarta-feira (26) a El Salvador para visitar a mega-prisão que abriga os venezuelanos deportados pelos EUA. Noem, uma defensora declarada da repressão à imigração de Trump, também planeja se encontrar com o presidente de El Salvador, Nayib Bukele.

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