Leis estaduais derrubadas pelo STF e o desenrolar de seguidos fatos escabrosos

Roraima foi o oitavo Estado a ter suspensa lei que facilitava armas para CACs por decisão do STF (Foto: Divulgação)

Roraima foi o oitavo Estado em que o Governo Federal conseguiu derrubar, na Justiça, uma lei que concedia porte de arma para os Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores (CACs), os quais faziam parte de um ambicioso plano de facilitar acesso a armas de fogo no país para que pudessem alimentar milícias e o crime organizado no país.   

No dia 14 passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou, por unanimidade, a lei estadual que permitia o porte de armas para atiradores desportivos em Roraima, atendendo a uma ação movida pela Advocacia-Geral da União (AGU), representando a Presidência da República contra o Estado. Agora, Roraima se junta a outros estados cujas leis semelhantes foram derrubadas: Mato Grosso do Sul, Paraná, Rondônia, Alagoas, Distrito Federal e Minas Gerais.

A lei roraimense fazia parte de um ambicioso pacote político que estava sendo gestado no país para facilitar a liberação de armas e também o garimpo, especialmente em terras indígenas. O STF também derrubou duas leis estaduais de Roraima, uma que liberava o garimpo com uso de mercúrio em terras não indígenas e outra que proibia as forças policiais e agentes ambientais estaduais de apreenderem maquinários e veículos usados por garimpeiros.

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Embora fossem leis distintas em contextos aparentemente desconexos, elas se complementavam. E os reflexos delas acabavam se encontrando de alguma forma. Medidas envolvendo CACs se ampliaram no governo anterior, quando o Brasil registrou um aumento de 665% nos registros de CACs entre 2018 e 2022, conforme dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022.

Paralelo a isso, em Roraima, a Polícia Federal começou a investigar um esquema de venda de armas ilegais para o garimpo, o que acabou chegando a policiais militares e outras autoridades do alto escalão. E tudo começou a fazer sentido. Recentemente, no começo desse mês, um major aposentado da PM de Roraima foi alvo da PF em operação contra venda de armas para garimpo na Terra Indígena Yanomami.

Antes disso, em duas operações realizadas em outubro de 2024, a PF investigou a venda ilegal de armas chefiada por policiais que tinham garimpeiros como principais compradores. Era um grupo de pelo menos 11 integrantes, chefiados por dois policiais penais. Em uma das operações, os alvos foram o comandante da PM, Miramintol Goiano, o filho dele e um parlamentar.

Essas operações foram desdobramentos da investigação iniciada em outra operação deflagrada em 2020 pela PF a fim de investigar agentes penitenciários suspeitos favorecer uma facção criminosa que atua nas unidades prisionais de Roraima. Como pode ser notado, desde a facilitação de armas para CACs começou a surgir no Estado um esquema de venda ilegal de armas para faccionados e para garimpeiros na Terra Yanomami.

Nesse interim, Roraima teve 327 armas de fogo ilegais apreendidas por órgãos federais de segurança desde o início do atual governo, no período entre janeiro do ano passado e abril de 2024, durante ações da Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp).

Considerando somente 2023, foram 285 apreensões em Roraima, um aumento de 61,9% em relação a 2022, quando 176 armas foram retiradas de circulação pelas forças federais.  Os dados são do ComunicaBR, plataforma de transparência do Governo Federal.

Não pode ser esquecido que a execução de um casal no Município do Cantá, em abril de 2024, um dos envolvidos suspeito de comprar munição era CAC, ou seja, tinha facilidade para comprar armas. Esse caso é emblemático, porque se cruza com a questão fundiária, inclusive a gravação de voz do episódio chama a atenção para supostas irregularidades no órgão fundiário estadual.

Não menos importante nesse bárbaro crime de ampla repercussão, cujo  autor dos tiros continua foragido, é que a covarde execução do casal foi cometida na presença de um capitão da PM, Helton John Silva de Souza, que era chefe de segurança do governador de Roraima e que nada fez para impedir ou fazer cumprir a lei diante do cometimento de um assassinato.

Ou seja, o desenrolar dos fatos confirmaram que leis estaduais para facilitar aquisição de armas e o garimpo, as quais foram derrubadas pelo STF, acabaram se cruzando inclusive com um provável esquema grilagem de terras, investigada por uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).

A sociedade precisa estar atenta aos meandros do poder local, em que a política inclusive se cruza também com crimes eleitorais, o crime organizado e o tráfico de drogas. Há uma terrível realidade que precisa vir à tona antes que tudo isso se agrave.

*Colunista

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