BC não pode procrastinar, nem se afobar, na função de reação, afirma diretor

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O diretor de Política Monetária do Banco Central, Nilton David, afirmou nesta sexta-feira, 21, que a autoridade monetária não pode se afobar ou procrastinar na função de reação, e abordou como isso impacta no juro neutro. Ele participou de uma live organizada pelo Bradesco BBI.

“O Banco Central não procrastina, mas também eu não posso me afobar, a qualquer sinal eu reagir, porque chances são ruídos e não sinais, então essa é um pouco a ideia. Ao fazer isso, você vai ter menos oscilação, por óbvio, você não vai reagir a ruído e aí passa um pouco a impressão que estamos suavizando ou fazendo média móvel, não é isso, é nada mais que um conceito de buscar os sinais e não os ruídos”, disse o diretor de Política Monetária.

David disse que a autoridade monetária tem bastante tranquilidade em relação à estimativa de juro neutro. “Trabalhamos com um juro neutro muito mais estrutural do que coisas desse tipo fazendo ruído, no final a ideia do Banco Central é sempre tentar pegar sinais e tentar dirimir os ruídos. Estamos bastante tranquilos com o que temos de juro neutro nesse momento”, afirmou o diretor.

Ele ainda defendeu que o BC tem plena convicção da potência da política monetária e disse que, em 2024, uma sucessão de fatores fomentaram o crescimento econômico, o que refletiu, também, nos juros.

“Acreditamos na capacidade da política monetária de colocar as coisas em ordem e não temos nenhuma razão para acreditar que isso mudou muito nos anos recentes. Até acreditamos que a potência da política monetária do Brasil não é a mesma que têm os países desenvolvidos, mas é uma coisa de décadas, não é uma coisa de agora. O que aconteceu agora foi que a surpresa da atividade vis-a-vis o percebido aperto monetário se deveu muito mais a eventos extraordinários que acabaram fomentando o crescimento, que acabou meio que indo de encontro à política monetária naquele instante”, comentou David.

‘Forward guidance’

O diretor de Política Monetária do Banco Central disse ainda que a autarquia evita conceder qualquer forward guidance além do que já consta na comunicação oficial. Dizer que a Selic se tornará “mais contracionista” reflete apenas a sinalização que já está na mesa, explicou.

Em dezembro, o Comitê de Política Monetária (Copom) aumentou os juros em 1 ponto porcentual, de 11,25% para 12,25%, e indicou mais duas altas da mesma magnitude. Em janeiro deste ano, o colegiado cumpriu a promessa ao elevar a taxa para 13,25% e reforçar que antevê outra elevação de mesmo nível em março, mas sem oferecer sinalização para maio.

“Não é um forward guidance adicional”, comentou Nilton. “A reunião [do Copom] de maio é a reunião de maio, não tem nada, não se fala nisso ainda.”

Segundo o diretor, é consenso entre todos os membros do Copom que a taxa Selic está em um nível “objetivamente contracionista” A promessa de continuar elevando os juros, ele explicou, se deve à maior incerteza no cenário, que exige um posicionamento mais cauteloso por parte do BC.

“A gente está objetivamente contracionista, a gente acha que tem de estar lá, porque esse é o melhor posicionamento para se ficar quando você tem um nível de incerteza desses que a gente tem hoje”, disse Nilton.

O diretor acrescentou que as variáveis de entrada nos modelos do BC estão mais incertas do que de costume, o que também aumenta a dispersão dos resultados. Por isso, rechaçou a avaliação de que a queda do dólar ante o real desde a última reunião pudesse ser suficiente para levar a autoridade monetária a estimar um IPCA no centro da meta no seu horizonte relevante.

Incertezas

David disse ainda que os mercados reagiram à incertezas em dezembro, que se refletiram bastante na questão cambial, e que agora no início deste ano a diminuição dessas incertezas implicou no reajuste de preços. “Acho que o mercado reagiu a incertezas, de onde elas vieram, as fontes, a combinação delas, fica meio que em segundo plano para a gente saber que veio de incertezas. O que a gente viu em dezembro foi um grande nível de incerteza aparecendo por todos os lados, e isso fez com que as moedas andassem bastante, o dólar na verdade, mais que as moedas “

Para ele, quando a incerteza diminuiu, como ocorreu em janeiro, os preços foram reajustados de acordo com esse processo. “Esse processo não se deu só no Brasil, e aliás eu não acredito que tenha sido no Brasil. De fato, o pivô mesmo foi lá fora, e obviamente que cada um tem a sua idiossincrasia que amplifica ou não isso”, disse.

Provocado sobre a atuação do Copom, em relação à precificação de cenário internacional, Nilton David devolveu com outra questão. “Será que esse consenso nosso de que a ineficiência vindo das tarifas produz um dólar mais forte via Fed, será que ele não pode estar errado à medida em que ao mexer demais nas tarifas, mexer demais na regulação, isso acabe produzindo um cenário em que, bem ou mal, a economia americana perca alguma atratividade?” disse.

Em relação à postura do Fed sobre a questão de tarifas nos Estados Unidos, ele defendeu que há “um espectro bastante aberto de possibilidades”. “É suposto, ele como autoridade monetária deveria se colocar no lugar onde tem o menor risco para as funções que ele cumpre, então ele deveria estar provavelmente com um foco maior numa coisa mais que aumente a atividade ou que aumente a inflação de alguma forma, não será a minha atividade, mas é o foco que ele deveria estar, maior para ele, não que isso seja o cenário base para ele, mas isso aqui é o que dá mais atenção, parece mais fácil lidar com o contrário que com isso nesse momento”, disse.

Para o diretor do BC brasileiro, o nível de incerteza sobre a política econômica dos Estados Unidos é muito maior agora. “O risco de incerteza com Estados Unidos é muito maior do que em anos anteriores e o mercado sabe disso”, comentou David, lembrando que há uma miríade de possibilidades e cenários nos Estados Unidos, que podem pressionar tanto para alta quanto para baixa, e que o mercado ainda não precificou todas as possibilidades.

E acrescentou: “É por isso que esse risco aparece nos dois lados, ele está tanto de alta como de baixa, a gente não sabe onde o mercado está vis-a-vis o que vai acontecer. Primeiro porque já é difícil saber onde o mercado está e mais ainda porque é mais difícil saber o que vai acontecer. A gente não tem essa certeza. Aliás, é a única certeza que eu tenho: que não dá para ter certeza. Se a gente não tem eu acho que ninguém deveria ter, porque realmente é bastante complexo para onde vai isso.”

Estadão Conteúdo

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