Das cheias às ondas de calor: Rio Grande do Sul no epicentro dos eventos climáticos extremos

(Foto:
Paulo Pinto/Agência Brasil)

Após as enchentes que submergiram parte do Rio Grande do Sul em maio de 2024, agora o estado se encontra diante de mais um evento climático: ondas de calor extremo. Enquanto os efeitos das cheias ainda são sentidos, o aumento das temperaturas intensifica ainda mais os desafios enfrentados pela população gaúcha.

Em 4 de fevereiro, o estado registrou a maior temperatura dos últimos 115 anos, conforme o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). No município de Quaraí, os termômetros marcaram 43,8 °C. No dia 10, Porto Alegre foi a cidade mais quente do Brasil, com 37,9°C. No dia seguinte, a capital gaúcha marcou 39,8°C, registrando um novo recorde, com índices de sensação térmica alcançando os 60 °C.

Além do desconforto térmico, os impactos diversos das ondas de calor vêm predominando nas manchetes dos jornais locais e nacionais: a estiagem já atinge mais de 90 municípios, a Justiça determinou o adiamento do início do ano letivo e projetos de lei foram protocolados para abordar as condições insustentáveis de trabalho ao ar livre em dias de calor extremo.

O Jornalismo desempenha um papel fundamental ao informar a população sobre os riscos das mudanças climáticas e ao cobrar medidas efetivas de governantes. Mais do que noticiar recordes de temperatura, é essencial discutir caminhos para enfrentá-los.

Na abertura do Jornal do Almoço, que foi ao ar no dia 10, a jornalista e apresentadora Cristina Ranzolin levantou a seguinte questão: “Os cientistas garantem que o calor extremo deve se tornar cada vez mais frequente, mas será que nós estamos preparados? Não é necessário termos planos emergenciais para enfrentar essas temperaturas? Leis e medidas que alterem o horário de trabalho, que prevejam distribuição de protetor solar, enfim, que nos protejam e adaptem a nossa rotina a essa nova realidade?”. 

Para debater sobre o que as cidades precisam fazer para enfrentar esse clima extremo, o JA convidou um grupo de especialistas: o climatologista da UFRGS, Francisco Eliseu Aquino; o especialista em saúde e segurança do trabalho, Luiz Alfredo Scienza; o deputado e vice-presidente da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa, Airton Artus; e o vice-presidente da Famurs, Márcio Amaral.

O debate – que abordou questões como gestão pública, infraestrutura, plantio de árvores e legislações trabalhistas diante das alterações climáticas – se estendeu ao longo de todo o programa, intercalado por outras notícias. A iniciativa é positiva, pois insere o assunto em diferentes momentos do noticiário, inclusive estando presente no espaço de  comentaristas – Rodrigo Lopes critica a posição do Governo do Estado em relação à organização do início das aulas.

Porém, mais do que falar de medidas paliativas, para encarar o calor extremo, valeria recordar o que vem contribuindo para gerar esse problema. É importante trazer medidas que possam mitigar os efeitos de ondas de calor, porém a perspectiva do factual, que se centra nos efeitos imediatos, deve ser alargada pelo Jornalismo.

Uma das soluções apresentadas no telejornal, a instalação de mais aparelhos de ar-condicionado, para permitir o conforto térmico diante de altas temperaturas, colabora para o incremento das mudanças climáticas. Estima-se que o uso desses aparelhos seja responsável por 10% do consumo global de energia e entre 4% e 8% das emissões globais de gases de efeito estufa, de acordo o National Renewable Energy Laboratory e o Observatório Regional de Energias Renováveis da Cepal.

Quando se fala da necessidade de alteração da legislação trabalhista, por exemplo, um dos especialistas aponta para a necessidade de reconhecer os riscos das mudanças climáticas e seus impactos na saúde dos trabalhadores. Sem a percepção de riscos, é difícil que haja preocupação em mudar algo ou de se pensar em formas de evitá-lo. A imprensa é um espaço de visibilidade desses riscos, sendo relevante tratar deles antes que eles se transformem em algo concreto — nesse caso, o calor extremo. O que tem nos deixado mais vulneráveis às mudanças do clima? Que os próximos eventos possam ser debatidos em sua complexidade antes de sentirmos na pele uma das manifestações da crise climática.

Texto publicado originalmente em Observatório do Jornalismo Ambiental.

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Clara Aguiar é estudante de Jornalismo na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e integrante do Grupo de Pesquisa Jornalismo Ambiental (CNPq/UFRGS). E-mail: claraaguiar14@hotmail.com.

Eloisa Beling Loose é jornalista e pesquisadora na área de Comunicação de Riscos e Desastres. Coordenadora do Laboratório de Comunicação Climática (CNPq/UFRGS). E-mail: [email protected].

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