Erradicando a pobreza no Brasil de forma definitiva e sustentável

Erradicando a pobreza no Brasil de forma definitiva e sustentávelOpenAI Dall-e

“Todas as pessoas são empreendedoras, mas muitas não têm a oportunidade de descobrir isso.” – Muhammad Yunus

Será que é verdadeiramente intransponível erradicar a pobreza no Brasil de forma definitiva e sustentável? Durante vinte anos, programas como o Bolsa Família receberam repasses robustos, e  ainda assim a eficácia desses investimentos continua questionável. Diante de tal cenário, urge a reflexão: será que os esforços empregados têm, de fato, cumprido seu nobre propósito?

Em pleno século XXI, é inadmissível que mais de 33 milhões de brasileiros não tenham  acesso à água potável, sendo forçados a recorrer a fontes contaminadas expondo-se a doenças letais. Cerca de 100 milhões vivem à margem de um saneamento básico adequado, relegados à prática desumana de despejar esgoto a céu aberto ou em rios que, paradoxalmente, irrigam suas próprias comunidades. Quase um milhão de lares permanecem na escuridão, desprovidos de energia elétrica, em um país que ostenta um dos mais grandiosos sistemas hidrelétricos do mundo.

O horror, contudo, não se limita a esses números. Milhares dormem nas frias calçadas das ruas, e milhões de crianças adentram as salas de aula com o estômago roncando, na tentativa de aprender alguma coisa. Este não é um mero problema de infraestrutura, mas uma falha brutal do Estado e da sociedade, que condena gerações inteiras à miséria e ao esquecimento.

Como então, trilhar o caminho da redenção? Supomos que se faça necessário um aporte de 1,6 trilhão de dólares, ao longo de uma década, para eliminar a pobreza de forma definitiva e sustentável. Para transcender um sistema político marcado por sua disfunção, devemos atrair recursos – tanto privados quanto públicos – oriundos não apenas do Brasil, mas também do estrangeiro. Para mitigar os riscos inerentes à nossa realidade, torna-se imperioso oferecer juros atrativos, na ordem de 15% ao ano em dólar americano. Em outras palavras, o investimento total chegaria a cerca de 4 trilhões de dólares.

Embora o Brasil seja a 9ª maior economia do mundo (FMI, 2021), frequentemente é percebido como um verdadeiro cemitério de oportunidades para investidores globais, onde o potencial é tragado pela incerteza e pela desordem jurídica.

A insegurança jurídica, evidenciada pelas constantes mutações legislativas e por processos judiciais de caráter imprevisível, fragiliza contratos e transforma leis em meros pontos de interrogação, como apontam análises da Confederação Nacional da Indústria (CNI). A isso se soma a corrupção endêmica – o Brasil ocupa a 94ª posição no Índice de Percepção da Corrupção (Transparency International, 2022) – que atua como um imposto invisível, drenando recursos e afastando o capital estrangeiro, sempre sedento por previsibilidade.

A elevada carga tributária, que atinge aproximadamente 33% do PIB (OCDE, 2022), oferece um retorno insatisfatório à sociedade, atendendo a apenas metade da população, enquanto a outra metade arca com investimentos em educação, saúde e segurança privada. Segundo o Estudo Global Sobre Homicídios 2023, divulgado pela ONU, o Brasil liderou o ranking  de países com mais homicídios no mundo em números absolutos. Oito dos dez países com as maiores taxas de homicídio estão na América Latina e no Caribe, reflexo de um sistema operacional governamental inadequado. Esta realidade, por si só, torna determinadas zonas economicamente inviáveis para as empresas e eleva os custos com segurança.

Para atrairmos os investimentos necessários, urge a criação de regiões especiais – as Zonas Experimentais de Governança Autônoma (ZEGA). Em outras palavras, é imprescindível estabelecer bolhas de independência estatal, operando sob um modelo de Parceria Público-Privada, no qual o sistema executivo, legislativo e jurídico sejam administrados por entidades privadas,  com ou sem fins lucrativos.

Para assegurar o retorno dos investidores e, por conseguinte, atrair os recursos almejados, estas regiões poderão definir seu próprio arcabouço jurídico – abrangendo leis civis, trabalhistas e tributárias –,  complementado pelo uso de segurança privada e câmaras de arbitragem –, permitindo a criação de um ambiente regulatório customizado, respaldado por concessões de no mínimo 100 anos. Para incrementar a segurança jurídica, serão adotadas as diretrizes do ICSID (International Centre for Settlement of Investment Disputes) e da UNCITRAL.

A implementação de um sistema robusto de transparência e governança, sustentado por auditorias externas regulares e pela independência das instâncias judiciais locais é imperiosa. A ZEGA oferecerá garantias de estabilidade regulatória, assegurando que as regras vigentes durante o período de investimento não sejam alteradas sem o prévio consentimento dos investidores. Ademais, a possibilidade de registrar negócios e ativos sob sua jurisdição proporcionará uma proteção legal sólida contra os riscos políticos e econômicos – um verdadeiro escudo contra a incerteza.

Novas cidades poderão ser edificadas em áreas despovoadas, ou, por meio de votação, os cidadãos poderão optar pela operadora e projeto que melhor atendam aos seus anseios, ou mesmo permanecer no modelo público atual, ainda que sem o fluxo de investimentos. As parcerias resultantes implicarão o pagamento de royalties ao governo e ao Estado, calculados como percentual da receita – de maneira simples e transparente.

O sistema de registros, outrora confinado aos cartórios, será revolucionado pela tecnologia de DAO (Distributed Autonomous Organizations) com Blockchain e IA na nuvem, estabelecendo contratos inteligentes entre o cidadão e o operador, com funções e responsabilidades claramente definidas para cada parte. As ZEGAs terão como objetivo a erradicação sustentável e definitiva da pobreza, com metas específicas; o não cumprimento destas poderá ensejar a substituição do operador, sem, contudo, comprometer as obrigações perante os investidores.

Para reduzir os riscos enfrentados pelos investidores, é crucial que os fundos ou empresas sejam listados em bolsa, conferindo liquidez aos ativos e promovendo, assim, maior transparência. Em setores que abrangem saúde, educação, esporte, segurança, além de infraestrutura de transporte, água, esgoto, energia elétrica, telecomunicação, sustentabilidade e moradia, o investimento permitirá ao operador alocar recursos destinados a prestar serviços de excelência à população.

Embora a operação utilize a moeda local, mecanismos de indexação e reservas em moedas fortes – como o dólar norte-americano – serão empregados para estabilizar as transações e mitigar a volatilidade. O uso de stable-coins será autorizado para as transações, enquanto a participação cidadã se dará através de um mecanismo inovador baseado em tokens (quadratic voting and funding), garantindo que as preferências dos cidadãos sejam respeitadas.

Nossa obrigação, enquanto cidadãos, políticos e empresários, é nos unirmos em volta deste nobre propósito, exercendo a devida pressão para que o governo incorpore o modelo ZEGA na Constituição, criando os incentivos necessários para a erradicação absoluta e perpétua da miséria em nosso país, de forma que investir no desenvolvimento e no potencial humano se revele, inequivocamente, o melhor negócio do mundo. 

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