Projeto de lei quer proibir crianças na Parada do Orgulho LGBTQIA+ em Sorocaba; entidade questiona medida


Iniciativa tramita desde o início de fevereiro e prevê até a possibilidade de cancelamento do evento, em caso de descumprimento. Praça Frei Baraúna durante a Parada do Orgulho LGBTQIA+, em 2019, em Sorocaba (SP)
Jomar Bellini/TV TEM/Arquivo
Um projeto de lei da Câmara de Sorocaba (SP) quer proibir a presença de crianças nos eventos da Parada do Orgulho LGBTQIA+. A iniciativa tramita desde o início de fevereiro e prevê até a possibilidade de cancelamento do evento, caso haja algum descumprimento.
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A Comissão de Diversidade Sexual e de Gênero, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em Sorocaba, faz uma série de ponderações e ressalvas sobre o texto do projeto, inclusive com relação à justificativa parlamentar.
Pelo projeto, de autoria da vereadora Tatiane Costa (PL), em caso de descumprimento, há multa de R$ 10 mil à entidade organizadora do evento, e de R$ 5 mil aos responsáveis pela criança. A multa dobra em caso de reincidência.
A vereadora, por meio de sua assessoria, disse que está organizando uma audiência pública para aprofundar o debate sobre o tema, após o assunto repercutir nas redes sociais. “Dado esse cenário, a audiência pública será uma oportunidade para que essas vozes possam trazer esclarecimentos adicionais e contribuir para um diálogo mais amplo e transparente sobre o tema”, disse.
O texto do projeto afirma ainda que, em uma terceira reincidência, a autorização do alvará para a realização do evento será cassada. Os valores arrecadados com as multas serão repassados para o Conselho Municipal da Criança e do Adolescente (CMDCA).
Ainda conforme o projeto, se comprovada a presença de criança e adolescente em eventos dessa natureza, o Conselho Tutelar e a Delegacia de Polícia da Infância e Juventude de Sorocaba deverão ser comunicados imediatamente. Não há menção sobre quem deverá fazer a fiscalização nos eventos.
Fachada da Câmara de Sorocaba (SP)
Marcel Scinocca/g1
Justificativa
Na justificativa para o projeto, a parlamentar cita que “a Parada do Orgulho LGBTQIA+ se tornou local de prática de exposição do corpo, com constante imagem de nudez, simulação de atos sexuais e manifestações que resultam em intolerância religiosa”.
Diz que diversas imagens “comprovam que o ambiente dos desfiles é completamente insalubre às crianças e aos adolescentes, que se encontram em relevante processo de lapidação moral, que projeta sua personalidade e sua capacidade de inter-relacionamento social”.
O texto ainda cita a questão da “formação moral”: “A exposição da criança ao evento supracitado é indesejável interferência em sua formação moral, podendo causar profundas lacerações e cicatrizes em sua futura personalidade”.
Pluralismo e competência
A advogada Taynara Kupper, que é presidente da Comissão de Diversidade Sexual e de Gênero, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Sorocaba, afirma que o contato com a diversidade “promove o respeito, a empatia e a cidadania, e a formação não seria ‘prejudicada’, mas, sim, enriquecida com a compreensão do pluralismo social”.
“Eventos culturais e manifestações políticas fazem parte da vida democrática, e as crianças frequentam diversas delas, como marchas religiosas, protestos políticos, festas populares e etc., mas o questionamento de suas presenças só surge quando o tema envolve a comunidade LGBTQIA+, e sempre sob o argumento de moralidade, o que evidencia um preconceito velado”, opina.
Ela ainda comenta sobre outros eventos, com possível incitação, por exemplo, ao uso de armas, que não apresentam o mesmo tratamento: “Se o objetivo é proteger e zelar pelas crianças e adolescentes, porque não apresentar um projeto que abrange todos os eventos sociais públicos?”, questiona.
“Perceba que é um projeto que vai restringir em si a própria autonomia dos pais, que são os responsáveis diretos para decidir sobre a participação das crianças em eventos públicos”, diz.
A advogada comenta se o Legislativo municipal teria a competência para discutir sobre o tema e disciplinar sobre uma norma jurídica para regular essa proibição. “Tenho a concepção jurídica que não, pois a competência para legislar sobre direitos civis, o que inclui os direitos das crianças e adolescentes, cabe exclusivamente à União.”
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