Após Lula dizer que Marina será a favor de petróleo na Foz do Amazonas, ministra cita dever de cortar combustível fóssil

VINICIUS SASSINE
BELÉM, AL (FOLHAPRESS)

O presidente Lula (PT) buscou demonstrar, durante um evento inteiro em Belém nesta sexta-feira (14), uma relação afável com sua ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva (Rede).

Marina sentou ao lado de Lula, recebeu sorrisos e abraços do presidente, uma foto dos dois de mãos dadas foi organizada pelo fotógrafo oficial do petista, Ricardo Stuckert.

Para além das aparências dos pequenos gestos públicos, as divergências entre Lula e Marina não poderiam ser mais evidentes.

No começo da manhã desta sexta, em seu segundo dia de agenda em Belém, Lula deu entrevista a uma rádio e afirmou ter certeza de que Marina “jamais será contra” a prospecção de petróleo na bacia Foz do Amazonas, na costa amazônica na altura do Amapá, porque “ela é uma pessoa inteligente”.

O presidente vem intensificando a pressão para liberação da licença, pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), necessária para a perfuração do poço no chamado bloco 59 da bacia Foz do Amazonas. O projeto é da Petrobras. O Ibama é vinculado ao ministério de Marina.

A ministra acompanhou o presidente na visita de dois dias a Belém. Esteve na quinta (13) em um evento para entrega de casas do programa Minha Casa Minha Vida, no distrito de Outeiro, ocasião em que passou boa parte do tempo olhando para a tela do celular.

Nesta sexta, Marina participou de evento no Mercado de São Brás para anúncio de investimentos na preparação da COP30 (conferência das Nações Unidas sobre mudanças climáticas), que será realizada em Belém de 10 a 21 de novembro.

A ministra se sentou entre o presidente e o ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), um dos fiadores no governo da ideia de exploração de petróleo na margem equatorial, que engloba a costa amazônica. A três cadeiras de distância, no lado oposto no palco, sentou-se o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), outro entusiasta da ampliação de exploração de petróleo.

Quando discursou, horas depois das falas do presidente na entrevista a uma rádio em Belém, Marina disse que existe um compromisso de fim do uso de combustível fóssil, definido numa COP.

“Nós ficamos 33 anos discutindo, fazendo regras, criando estrutura. Agora não tem para onde fugir”, disse a ministra. “A decisão foi tomada na COP28, nos Emirados Árabes Unidos: triplicar energia renovável, duplicar eficiência energética, fazer a transição para o fim do uso de combustível fóssil.”

Segundo Marina, existe uma nova economia, que é uma economia de baixo carbono. “O Brasil pode ser o endereço dos melhores investimentos. Tem energia limpa e tem de continuar investindo na descarbonização de sua matriz energética, inclusive com hidrogênio verde.”

A redução da dependência e uso de combustíveis fósseis deve contemplar países produtores e consumidores, com os “países ricos à frente e países em desenvolvimento em seguida”, segundo a ministra. “Ao mesmo tempo, precisamos ser capazes de fazer transição justa, especialmente para os mais vulneráveis, como pautou o presidente Lula no G20.”

Lula trocou diálogos com a ministra durante a cerimônia, buscou colocá-la à frente nos registros fotográficos dos anúncios feitos, citou Marina no discurso que fez.

O presidente, no discurso, afirmou que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, deixou o Acordo de Paris -o acordo costurado, também no âmbito de uma COP, para que a elevação das temperaturas no planeta não ultrapasse 1,5°C- e disse achar que Trump “nem vai vir aqui”, na COP30. “Eles não querem compromisso”, afirmou, em referência aos países ricos.

Na fala, Lula não fez menções ao compromisso de redução de combustíveis fósseis.

Em maio de 2008, no segundo mandato do petista, Marina pediu demissão do cargo de ministra do Meio Ambiente, numa das crises políticas mais ruidosas daquela gestão. Ela disse, na ocasião, que houve “crescentes resistências” ao trabalho no ministério. Além disso, havia pressão para que licenças ambientais a hidrelétricas na amazônia fossem aceleradas.

Marina voltou a se aliar a Lula, e a principal pressão, hoje, é pelo licenciamento ambiental necessário à exploração de petróleo na bacia Foz do Amazonas.

Depois do evento relacionado às obras da COP30, Lula seguiu para uma agenda na região de Parauapebas (PA). A mineradora Vale anunciou investimento de R$ 70 bilhões para retomada de mineração de ferro e expansão da produção de cobre em Carajás. Marina e outros ministros que estiveram em Belém não acompanharam o presidente, segundo a assessoria do Palácio do Planalto.

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