A técnica da avalanche de notícias de impacto no condicionamento da opinião pública

(Foto: congerdesign/Pixabay)

Aumenta a necessidade e urgência do jornalismo revisar os critérios para determinar a relevância e a confiabilidade das notícias publicadas na imprensa e sites informativos online. As regras e valores adotados até agora na maioria esmagadora das redações estão obsoletas, diante do crescimento avassalador das técnicas de impacto como forma de produzir e hierarquizar manchetes em publicações noticiosas online.

As técnicas de impacto ganharam espaço no jornalismo depois da intensificação da avalanche informativa na internet, quando a intensidade, diversidade e rapidez dos fluxos noticiosos reduziram drasticamente o tempo disponível pelo leitor, ouvinte, telespectador ou internauta para julgar a confiabilidade, relevância e exatidão das notícias. Isso acabou se refletindo nas rotinas e regras tento em redações como na performance de profissionais autônomos.

As manchetes, que sempre funcionaram basicamente como chamariz de dados, fatos, eventos e ideias considerados jornalisticamente importantes, foram transformadas agora no componente-chave das notícias publicadas online. Se a leitura de textos era a principal responsável pela formação de opiniões por meio da reflexão, na era do dilúvio informativo as manchetes assumiram este papel, através da sobreposição e repetição de dados e fatos nem sempre importantes e confiáveis.

Hoje, o jornalismo e a imprensa perderam o monopólio da produção e disseminação de notícias em plataformas digitais (Medium, BlueSky, BuzzFeed, Linkedin, Facebook, TikTok e WhatsApp, por exemplo) para assumirem, cada vez mais, a função de curadores, checadores e interpretadores de informações já publicadas. As redes e plataformas canalizam a grande massa de informações, logo são as principais responsáveis pelo acúmulo de impactos noticiosos devido ao seu elevadíssimo número de usuários.

A imprensa acabou encontrando na interpretação das notícias o nicho para sobreviver num mercado onde a sua sobrevivência é cada vez mais difícil. É uma função essencial, por causa do efeito desorientador gerado pelo excesso de dados, fatos e eventos em circulação na internet, fenômeno complicado ainda mais pela proliferação de notícias falsas e pela desinformação. É aí que está o grande desafio da atualização dos procedimentos funcionais de repórteres, editores e analistas tanto em redações como no trabalho individual.

Quando a quantidade acaba valendo mais que a qualidade

Steve Bannon, o ex-estrategista político de Donald Trump e atual guru da extrema direita norte-americana, foi um dos primeiros a normatizar o uso da estratégia de impactos noticiosos junto à imprensa. Ele recomendou que os seus seguidores produzam o máximo possível de notícias distorcidas e de impacto porque “algumas delas furariam a checagem de confiabilidade adotada pela maioria dos jornais e acabariam sendo publicadas”.

Bannon não frequenta mais os corredores da Casa Branca porque se tornou um desafeto do bilionário Elon Musk, o principal assessor de Trump. Mas o presidente segue fielmente a estratégia dos impactos noticiosos. O volume absurdo de decisões adotadas pelo presidente norte-americano nas primeiras semanas de exercício do poder desnorteou a imprensa e a opinião pública nos Estados Unidos e no resto do mundo, criando um dilema crucial para os profissionais da comunicação.

O desafio do jornalismo está em analisar o conjunto dos impactos em vez de interpretá-los e contextualizá-los um por um. O grande objetivo dos estrategistas da comunicação pública é o efeito que o fluxo de notícias vai provocar. Eles não estão preocupados com a veracidade, exatidão, atualidade e pertinência de dados, fatos, eventos e ideias, os dogmas principais do jornalismo pré-avalanche informativa.

Para poder cumprir com a missão de orientar o público, o jornalismo precisa agora focar no fluxo de notícias e não em cada informação. Preocupar-se mais com as estratégias embutidas no fluxo do que com a formatação e o conteúdo. Isto não quer dizer que a confiabilidade de uma notícia seja deixada de lado. Muito pelo contrário. Parafraseando o dito “é possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade” (1) é possível compreender como uma manchete baseada na descontextualização de um ou mais dados contidos numa informação, todos verdadeiros, pode induzir as pessoas a um grande equívoco.

Desconstruir manchetes inspiradas neste desvio informativo exige um considerável conhecimento de repórteres, editores e comentaristas sobre comunicação e política, coisa que a maioria das redações não tem, porque foram enxugadas ao máximo para economizar custos.

  1.  A frase foi usada num comercial da Folha de S. Paulo, em 1987, e ampliada em 2020 pelo consultor José Roberto Bodstein para: “É possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade, apenas reunindo as partes que interessam que sejam ditas. O melhor que se pode fazer nesse sentido é não esquecer que meia verdade, na maior parte das vezes, é uma mentira inteira!”

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Carlos Castilho é jornalista com doutorado em Engenharia e Gestão do Conhecimento pelo EGC da UFSC. Professor de jornalismo online e pesquisador em comunicação comunitária. Mora no Rio Grande do Sul.

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