MPT propõe acordo com BYD e terceirizadas na Bahia, e prevê indenização de R$ 200 mi

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JOÃO PEDRO PITOMBO
SALVADOR, BA (FOLHAPRESS)

O MPT (Ministério Público do Trabalho) apresentou uma proposta de Termo de Ajustamento de Conduta para a montadora chinesa BYD (Build Your Dreams) e duas empresas terceirizadas que atuavam na construção da fábrica em Camaçari (50 km de Salvador).

Uma força-tarefa de órgãos federais afirmou em dezembro ter identificado a presença de 163 operários chineses terceirizados trabalhando em condições consideradas análogas à escravidão nas obras da fábrica da montadora de carros elétricos.

Em nota, a BYD confirmou que iniciou conversas para a elaboração de um Termo de Ajustamento de Conduta e que as tratativas ocorrem em sigilo. Destacou ainda que “praticamente todos os pontos levantados durante a fiscalização do MPT” já foram ou estão sendo resolvidos.

“A empresa reafirma seu respeito pelas instituições brasileiras e sua disposição em colaborar plenamente com as autoridades para demonstrar que suas operações no país estarão sempre em conformidade com as exigências legais e regulamentares”, informou.

Os termos do acordo não foram divulgados, mas a reportagem apurou que a proposta inclui uma indenização de R$ 200 milhões por danos morais coletivos. Também há previsão de indenizações para os trabalhadores, além da definição de parâmetros para a contratação de chineses para as obras da fábrica.

A ideia é que o acordo sirva como uma espécie de baliza para contratos futuros de empresas chinesas que queiram atuar com trabalhadores do próprio país no Brasil.

A proposta do Termo de Ajustamento de Conduta foi apresentada às empresas na última semana de janeiro e, desde então, está sendo avaliada pela BYD e pelas terceirizadas Jinjiang Construction e AE Corp.

Uma reunião foi realizada na última terça-feira (11) para alinhar os termos da proposta, e as empresas pediram mais prazo para dar uma resposta final.

Novas reuniões devem ser feitas ao longo da próxima semana e a expectativa dos procuradores é que o acordo seja selado ainda em fevereiro, antes do Carnaval.

A BYD lançou a pedra fundamental para construção da fábrica em outubro de 2023. A montadora chinesa assumiu o parque industrial que era da Ford, que atuou na Bahia entre 2001 e 2021. O complexo industrial será composto por três fábricas, com investimento previsto de R$ 5,5 bilhões e capacidade inicial de produção de 150 mil carros elétricos e híbridos por ano.

O resultado parcial das inspeções foi apresentado em dezembro pelo Ministério Público do Trabalho, Ministério do Trabalho e Emprego, Defensoria Pública da União, Polícia Rodoviária Federal, Ministério Público Federal e Polícia Federal.

Em audiência em janeiro, a BYD e as três empresas contratadas para a construção da fábrica informaram que todos os trabalhadores resgatados já receberam os valores referentes à rescisão dos contratos e retornaram para a China. As empresas se comprometeram a encaminhar os documentos que comprovam os créditos dos valores e o custeio do retorno para casa.

A proposta de termo de ajuste de conduta foi fechada após a conclusão do relatório da fiscalização realizada no canteiro de obras da fábrica em Camaçari.

A auditoria constatou superlotação nos alojamentos dos trabalhadores da empresa terceirizada Jinjiang, que não tinham colchões, nem condições adequadas de higiene. Na época, a força-tarefa determinou a interdição de alojamentos e trechos do canteiro de obras.

A investigação apontou que operários estavam distribuídos em cinco alojamentos em Camaçari. Em apenas um deles, destinado a funcionários administrativos, não houve resgate de trabalhadores.

Em um dos alojamentos, segundo a fiscalização, os operários dormiam em camas sem colchões e não tinham armários para seus pertences, que ficavam misturados com materiais de alimentação. Havia apenas um banheiro para cada 31 trabalhadores, o que os forçava a acordar às 4h para se preparar para sair para trabalho às 5h30.

Além de insuficientes, de acordo com a investigação, os banheiros não eram separados por sexo e apresentavam condições precárias de higiene. Sem local apropriado para lavar roupas, os trabalhadores usavam os banheiros para esta finalidade.

Ao menos 107 chineses tiveram seus passaportes retidos pela empresa e parte deles só podia sair dos alojamentos com autorização, segundo os auditores.

O procedimento de investigação foi instaurado pelo MPT a partir de uma denúncia anônima recebida no dia 30 de setembro. Uma inspeção foi realizada dia 11 de novembro na área onde a empresa está construindo sua linha de montagem.

A BYD informou que rescindiu o contrato com a construtora terceirizada Jinjiang Construction e contratou uma empresa brasileira para realizar as adequações necessárias na obra da fábrica para suspensão dos embargos parciais.

“Assim que detectamos os problemas com as construtoras contratadas para realizar a obra, reforçamos a fiscalização e exigimos todas as correções necessárias, sempre priorizando o cuidado com os trabalhadores”, informou.

A empresa ainda destacou que todos os trabalhadores mencionados na notificação de 23 de dezembro retornaram à China e receberam as verbas rescisórias. Todos os trabalhadores estrangeiros estão provisoriamente hospedados em hotéis e novas moradias estão sendo selecionadas para os que ficarem no país a trabalho.

Todos os trabalhadores das construtoras contratadas para a obra agora almoçam no refeitório e recebem as refeições conforme as regras trabalhistas.

O Jinjiang Group alegou problemas de tradução e diferenças culturais, e disse que as perguntas dos auditores brasileiros foram “sugestivas”. A empresa também publicou um vídeo mostrando um grupo de trabalhadores chineses, com um deles lendo uma carta.

A carta dizia que 107 trabalhadores haviam entregado seus passaportes à empresa para obter ajuda na solicitação de um certificado de identidade temporário no Brasil. Na avaliação dos auditores, os chineses tiveram seus passaportes retidos pela empresa.

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