Por que acidentes com aviões particulares estão aumentando no Brasil

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PEDRO CANÁRIO
SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS)

Com a queda de um avião de pequeno porte na última sexta-feira (7) em uma avenida de São Paulo, que deixou dois mortos, o número de vítimas em acidentes do tipo subiu para dez neste ano. Foi o 22º acidente aéreo do ano, segundo dados do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos).

Não é só impressão de quem lê o noticiário e se lembra de casos que tiveram repercussão: os acidentes aéreos com aviões particulares estão ficando mais frequentes.

Em 2024, o Cenipa registrou o maior número de acidentes aéreos em relação aos dez anos anteriores – foram 175 acidentes que mataram 152 pessoas. Em 2015, foram 172 acidentes, com 79 mortes.

O salto começou em 2022. Naquele ano, foram 138 acidentes com 49 mortos. No ano seguinte, já foram 155 acidentes, com 77 mortos.

Raul Marinho, diretor técnico da Abag (Associação Brasileira de Aviação Geral), explica que o número de acidentes cresceu porque “a frota de aviões aumentou muito depois da pandemia”.

De acordo com dados da Abag, em 2022, ano do fim da emergência de saúde da pandemia, o Brasil tinha 9.607 aviões executivos. Em outubro de 2024, a frota passou a contar com 10.484 aviões do tipo.

É esta categoria – a chamada aviação executiva – que concentra a maioria dos acidentes registrados nos últimos anos. Também chamada aviação geral, ela abrange todos os tipos de aeronaves que não fazem voos regulares (linhas aéreas) nem militares.

De acordo com o Cenipa, dos 1.569 acidentes aéreos registrados de janeiro de 2015 até a última sexta, quase metade (727) aconteceu na chamada aviação privada -aviões que não podem cobrar para transportar passageiros, de uso exclusivo de seus proprietários.

MENOS SEGURANÇA E MENOS CONDIÇÕES

Raul Marinho diz acreditar que isso se deve a três fatores:

O primeiro é estatístico: menos de 5% da frota brasileira são aviões de linhas comerciais, enquanto 95% são de aviação executiva -e, dentro disso, 80% são aviação privada.

Portanto, é mais provável que a maioria dos acidentes aconteça com aviões menores.

O segundo fator é que “o segmento de aviação geral opera com estrutura muito mais pobre que a linha aérea, na qual operam as grandes companhias”, diz Marinho.

Segundo ele, os voos de carreira operam nos 150 maiores aeroportos do país, que também são os aeroportos mais seguros e mais equipados. Têm torre de controle, estação meteorológica, fiscalização constante das condições da pista, etc..

“A aviação geral de pequeno porte opera em todos os 5.000 aeroportos do Brasil, e aí não tem estação meteorológica, tem terra, grama, cascalho na pista? A cerca está furada, e aí entra animal, tem lixão do lado, pássaros”, afirma Marinho.

Já o terceiro fator é que a fiscalização da aviação privada é menos rígida que a da aviação de carreira e a do táxi aéreo.

Segundo o diretor técnico da Abag, a Anac (Agência Nacional de Aviação) parte do pressuposto de que, “se o avião é seu, o problema é seu”, já que a aviação privada não pode cobrar para levar passageiros.

Em outras palavras, é o dono ou o operador da aeronave que deve cuidar das questões de segurança e estar em dia com as regras da Anac. É um setor que não passa pelo que o mercado chama de “vigilância continuada”.

JULGAMENTO DO PILOTO

Outro fator a ser considerado nessa equação é a exigência de pilotos. A Anac exige dos aviões para transporte de passageiros, tanto os de linha quanto o táxi aéreo, a presença de dois pilotos no avião, além da contratação de diretores técnico e de operações.

A aviação executiva não tem isso. “Quando o avião chega a Ubatuba, por exemplo, e o piloto vê que a pista é pequena e o tempo não está dando condições, um táxi aéreo tem o copiloto e uma estação de controle para adverti-lo. Num avião particular, não. O piloto decide da cabeça dele.”

Os dados do Cenipa corroboram. A maior causa de acidentes com vítimas dos últimos dez anos foi “falha ou mau funcionamento do motor”, seguido por “excursão de pista” – quando o avião ultrapassa os limites da pista de pouso. Foram 355 acidentes cuja causa registrada foi falha no motor e 290, por excursão de pista.

No entanto, o fator que mais contribuiu para acidentes com vítimas, segundo o Cenipa, foi “julgamento de piloto”. Esse foi o fator em 463 acidentes nos últimos dez anos.

O Cenipa considera julgamento de piloto a “inadequada avaliação, por parte do piloto, de determinados parâmetros relacionados à operação da aeronave”.

Em segundo lugar, respondendo por 326 acidentes, está a “inadequação no uso dos comandos de voo da aeronave por parte do piloto”.

Depois, vêm “processo decisório” (244 acidentes) e “atitude” (228), que, ainda conforme o Cenipa, têm a ver com o descumprimento intencional de regras operacionais.

Enquanto isso, só 72 acidentes tiveram como principal fator contribuinte as condições meteorológicas.

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