STF e Congresso pregam harmonia e relação franca, mas mantêm desconfianças

tres poderes

VICTORIA AZEVEDO, CATIA SEABRA, RENATO MACHADO, THAÍSA OLIVEIRA E ANA POMPEU
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

Os chefes do Legislativo e do Judiciário pregaram harmonia e relação franca entre os Poderes nesta segunda-feira (3), data que marcou a retomada dos trabalhos no Congresso Nacional e no STF (Supremo Tribunal Federal) em 2025, mas mantiveram uma troca de recados indicando a relação de desconfiança entre as instituições após a mudança na cúpula do Parlamento.

As falas dos presidentes Luís Roberto Barroso (STF), Davi Alcolumbre (Senado) e Hugo Motta (Câmara dos Deputados) foram mais um capítulo do embate que tem marcado a relação entre o Legislativo e o Judiciário nos últimos meses em torno das emendas parlamentares.

Alcolumbre afirmou que o Congresso não pode ser “cerceado”, Motta citou “respeito às competências” dos Poderes e Barroso, por sua vez, falou em “conversa direta, aberta e franca”.

A presença dos ministros do STF Alexandre Moraes e Gilmar Mendes, além do presidente do STF, na solenidade do Congresso foi encarada como abertura de canal de diálogo em busca de uma solução para o impasse das emendas. Os dois magistrados se sentaram na primeira fileira.

O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), disse que Motta (Republicanos-PB) informou que pretende procurar o ministro Flávio Dino, relator de ações que discutem as emendas no STF.

Na mensagem enviada pelo Palácio do Planalto ao Congresso, o presidente Lula (PT) também falou em harmonia e que, em 2025, o Executivo planeja reforçar o diálogo institucional com o Legislativo para alinhar planos de ação em prol do desenvolvimento sustentável do país, estratégia que “inclui direcionar as emendas parlamentares para projetos que sejam prioritários”.

“Essa abordagem não só agilizará a implementação das emendas parlamentares, mas também respeitará a autonomia dos Poderes, mantendo a legitimidade, a transparência e a capacidade de rastreamento das ações, levando em conta a obrigatoriedade das emendas e seu papel vital em distribuir os recursos públicos por uma ampla variedade de municípios no Brasil”, disse o texto presidencial.

Eleito com os votos de 73 dos 81 senadores para presidir o Senado no biênio 2025-2026, Alcolumbre (União Brasil-AP) disse que “a recente controvérsia sobre emendas parlamentares ao Orçamento ilustra a necessidade de respeito mútuo e diálogo contínuo”.

“As decisões do Supremo Tribunal Federal devem ser respeitadas, mas é igualmente indispensável garantir que este Parlamento não seja cerceado em sua função primordial de legislar e representar os interesses do povo brasileiro, inclusive, levando recursos e investimentos à sua região.”

Mesmo pregando harmonia com o Executivo e o Judiciário, Alcolumbre defendeu que o Congresso “seja a base de todas as decisões” por representar os eleitores e acrescentou que um Legislativo forte é “indispensável” à estabilidade democrática.

“Vamos trabalhar em harmonia com o Executivo e o Judiciário, mas sempre garantindo que a voz do povo, representada aqui neste Parlamento, seja a base de todas as decisões”, disse.

“O Executivo, o Legislativo e o Judiciário não são adversários; são pilares que sustentam a nação. Conclamo à harmonia e ao equilíbrio, pois somente assim resguardaremos os direitos e as prerrogativas constitucionais do Congresso Nacional.”

Motta reforçou nesta segunda o discurso de harmonia e independência entre os Poderes que tem feito desde a eleição, no sábado (1º). Ele foi escolhido para comandar a Câmara nos próximos dois anos com o apoio de 444 dos 513 deputados federais.

O presidente da Câmara disse que o Brasil está no caminho certo, que vai trabalhar em sintonia com o Senado e que são “dias seguros na política”, com temperança, equilíbrio, sobriedade e diálogo.

“Essa independência e harmonia pressupõe o desvelo obstinado no cumprimento das atribuições constitucionais e o respeito às competências dos demais Poderes, norteado sempre pelo interesse público”, afirmou.

Em agosto do ano passado, o ministro Flávio Dino determinou que o governo federal suspendesse o pagamento das emendas parlamentares até que o Congresso desse mais transparência e rastreabilidade à distribuição do dinheiro.

Conversa direta
Barroso defendeu a corte e afirmou que não há necessidade de recados entre ele e representantes dos outros Poderes porque a conversa será direta, aberta e franca.

“Alguém me perguntou na entrada se eu havia recebido um recado, ou compreendido um recado. A primeira coisa que me ocorreu foi: entre nós não há necessidade de recados, nós temos conversa direta, aberta e franca de pessoas que se querem bem, que se ajudam e que, quando eventualmente divergirem, vamos ser capazes de sentar em uma mesa institucionalmente e absorvermos a divergência”, disse.

A declaração de Barroso foi dada durante a abertura do ano legislativo, com o plenário da Câmara dos Deputados lotado de parlamentares, dois dias depois de os novos presidentes do Congresso darem recados ao STF.

Mais cedo, durante a abertura do ano judiciário no plenário do STF, Barroso fez um discurso de união entre os três Poderes e disse enxergar o Judiciário como imune às paixões políticas. De acordo com ele, as decisões de magistrados têm potencial de dividir a sociedade e, por isso, é natural que gerem insatisfação.

“Todas as democracias reservam uma parcela de poder para ser exercida por agentes públicos que não são eleitos pelo voto popular, para que permaneçam imunes às paixões políticas de cada momento. O título de legitimidade desses agentes é a formação técnica e a imparcialidade na interpretação da Constituição e das leis”, disse.

Pela manhã, Lula recebeu a dupla Alcolumbre e Motta no Palácio do Planalto ao lado dos líderes do governo e dos ministros Rui Costa (Casa Civil), Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Sidônio Palmeira (Secretaria de Comunicação Social) e Márcio Macêdo (Secretaria-Geral).

Uma parte do encontro foi aberta à imprensa. Questionado depois por jornalistas sobre o papel de Alcolumbre e Motta na reforma ministerial, Padilha afirmou que o tema ainda não foi tratado por Lula, mas disse que os dois têm influência em seus partidos.

O ministro disse ainda que o imbróglio das emendas parlamentares —tema colocado como prioridade pelos dois eleitos no sábado— não foi discutido.

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