Campanha com ‘passagem de ida’ para imigrantes gera polêmica na Alemanha

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JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS)

Depois de assumir a remigração, eufemismo para deportação em massa, como item de campanha, a AfD, partido de extrema direita da Alemanha, causou nova polêmica ao criar nesta semana uma peça de propaganda em formato de passagem aérea: só de ida e em nome de “imigrantes ilegais”.

A campanha para as próximas eleições parlamentares, antecipadas para 23 de fevereiro após o fim da coalizão montada pelo governo Olaf Scholz, começou oficialmente no último domingo (12). As peças tradicionais, cartazes com slogans e imagens dos candidatos, já aparecem nas ruas do país, em pontos de publicidade regular e também em postes de luz.

O impresso da AfD começou a ser distribuído aos milhares em Karlsruhe, cidade no leste, próxima à fronteira com a França, conhecida por abrigar os tribunais superiores da Alemanha. O formato de bilhete aéreo, afirmou o partido, funciona como “uma oportunidade de informar os eleitores, de forma simplificada, sobre exigências legítimas e legalmente compatíveis” com o plano de remigração.

A explicação estaria em uma espécie de disclaimer no verso da passagem simulada, atestando que o projeto nunca afetaria cidadãos alemães, entre outros itens. A propaganda, no entanto, traz também elementos provocativos, como a frase “em casa, também é bom”.

No fim de semana, na convenção da AfD que a apontou por aclamação como candidata a premiê, Alice Weidel assumiu que o partido poderia promover deportações em massa caso assumisse o poder. “Se chamam de remigração, então será remigração”, declarou a parlamentar em discurso. É a primeira vez que a AfD, fundada em 2013, tem um nome para o cargo máximo do Executivo alemão.

Remigração, até o ano passado, era uma espécie de palavrão no léxico político europeu. Ainda que habitasse discursos e planos de gaveta de extremistas, era evitada pelas figuras de grande visibilidade da direita, como Weidel. Além de polêmico, o plano é em tese ilegal, já que a legislação alemã, assim como a europeia, não permite a deportação em massa.

Segundo a imprensa local, a polícia investiga possível crime de ódio na ação. A distribuição dos folhetos também teria sido direcionada para áreas com mais fluxo de imigrantes, o que o partido nega. Robert Habeck, candidato a primeiro-ministro dos Verdes, afirmou que a publicação da AfD tinha caráter racista.

“Ninguém virá para a Alemanha se tiver a sensação de que o racismo impera aqui, e isso é puro racismo.”
Habeck, ministro da Economia de Olaf Scholz, superou nos últimos dias Weidel nas pesquisas sobre quem deveria assumir o comando do país. O potencial efeito do apoio de Elon Musk à extremista ainda é uma incógnita. Friedrich Merz, da CDU, é o mais lembrado na média dos levantamentos, com 24%, seguido por Habeck (21%), Weidel (18%) e Scholz (16%). A pergunta serve apenas como um termômetro da opinião pública, já que as eleições na Alemanha são indiretas.

Na corrida parlamentar, a CDU lidera, com mais de 30% das intenções de voto, seguida por AfD (20%), SPD, de Scholz (16%) e Verdes (13%). Alguns levantamentos já mostram os Verdes à frente dos sociais-democratas, e todos percebem a AfD em ascensão neste momento.

Ainda que a crise imigratória ocupe boa parte do debate eleitoral, o ponto que mais incomoda o eleitorado alemão neste momento é a economia. Nesta quarta-feira (15), o Escritório Federal de Estatísticas anunciou que o PIB do país contraiu 0,2% em 2024, confirmando a expectativa de analistas.

Um ano antes, a contração fora de 0,3%, e uma revisão dos números do último trimestre, a ser divulgada no fim deste mês, pode configurar recessão técnica. Já é, de qualquer forma, o mais longo período de estagnação econômica da Alemanha no pós-guerra.

Termos como desindustrialização, infraestrutura decadente, guerra tarifária e transição energética claudicante habitam a campanha, porém com poucas soluções palpáveis. Merz, que fez fortuna no mercado financeiro antes de voltar à política em 2019, promete uma ampla reforma na regulação de impostos e benefícios sociais, mas é criticado pelos adversários por não mostrar de onde tirará dinheiro para tantas manobras.

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