LUCAS LACERDA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
O número de homicídios de pessoas negras em 2023 no Brasil, 35.213, caiu 0,9% na comparação com 2022, que terminou com 35.531 mortos. Mas não apenas os óbitos foram mais que o triplo do que os de não negros (9.908) no ano retrasado como a redução também ficou abaixo da queda de 2,9% no segundo grupo.
É o que mostram dados do Atlas da Violência 2025, divulgado nesta segunda-feira (12). Produzido em parceria entre o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o estudo também mostra que o risco de uma pessoa negra -considerando a soma de pretos e pardos- ser vítima de homicídio no país é 2,7 vezes aquele da população não negra.
Entre as regiões do país, os homicídios contra pessoas negras cresceram de 2022 para 2023 no Sudeste, com alta de 3,8%. Os números também subiram na comparação entre não negros, mas em menor proporção, de 1,9%. Já no período de 2013 a 2023 na região, houve queda de 39,4% entre pessoas negras e de 44,7% para pessoas não negras.
Em todas as regiões para o período houve queda nos homicídios de pessoas negras. A maior delas no Centro-Oeste (46,2%), e a menor, no Nordeste (5%).
No recorte por unidades da federação, o Amapá, que também teve o maior disparo no total de homicídios por 100 mil habitantes de 2022 para 2023, liderou a lista, com taxa que passou de 48,8 mortos para 70,2 mortos -um salto de 43,9%.
O estado também registrou o maior aumento na comparação entre 2013 -quando a taxa foi de 29,9 mortes- e 2023, com 134,8% de alta. Em seguida, estão Piauí (27,4%) e Tocantins (23,3%).
De 2022 a 2023, Rio de Janeiro (13,6%) e Santa Catarina (13,1%) tiveram a a segunda e a terceira maiores altas, respectivamente. Considerando apenas o ano de 2023, o Amapá registrou a pior taxa, seguido por Bahia (50,8 mortos por 100 mil habitantes) e Pernambuco (48 mortos por 100 mil hab.). O maior risco relativo de homicídio para uma pessoa negra é o de Alagoas: 47,8 vezes o de assassinato de uma pessoa não negra.
Os dados evidenciam que a população negra continua mais vulnerável à violência letal no Brasil, segundo Thaís Carvalho, pesquisadora do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
“A população negra enfrenta, ao longo da vida, contextos de maior vulnerabilidade em relação à população não negra, sobretudo à branca. Então é esperado que essas desigualdades acabem refletindo em uma redução mais lenta.”
Esse cenário fica evidente na análise de marcadores de gênero, classe e escolaridade, por exemplo.
A escolaridade, cita a pesquisadora, foi analisada no Plano Juventude Negra Viva, de 2024, que mostrou uma relação entre mais tempo de escolarização e menor mortalidade por homicídios. Mas uma variável isolada, diz ela, não é capaz de lidar com os múltiplos efeitos do racismo.
“É preciso buscar integração entre essas áreas. É essencial implementar políticas que promovam empregabilidade, assistência social em territórios vulneráveis, controle externo da atividade policial com foco em viés racial e, talvez o mais fundamental, o mapeamento e monitoramento de dados com recorte racial.” Para Thaís, essas informações podem orientar políticas de forma mais eficiente.
Homicídios de pessoas negras no Brasil
Taxa de mortes por 100 mil hab. em 2023
AP – 70,2
BA – 50,80
PE – 48
AL – 47,80
AM – 41,40
CE – 39,80
RN – 38,40
SE – 36,2
MT – 35,9
ES – 34,6
RO – 34,2
PB – 33,80
RJ – 33,5
PA – 32,30
RR – 30,3
MA – 29,90
Brasil – 28,90
TO – 28,6
GO – 26,20
AC – 26,1
PI – 25,1
MS – 23,40
PR – 21
RS – 18,7
MG – 16,1
DF – 13,70
SC – 11,20
SP – 7,9
Fonte: Atlas da Violência 2025/Ipea e Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Embora seja sabido que homens jovens são a maior parcela do contingente de pessoas negras assassinadas, o Atlas também mostra que homens idosos corriam mais risco de homicídio no período abordado no estudo, 2013 a 2023.
A taxa para este grupo em 2023, considerando as pessoas com mais de 60 anos, foi de 14,2 mortos para cada 100 mil habitantes. O indicador cai a 8,8 mortos para homens idosos não negros.
“Novamente, esse cenário pode ser explicado por múltiplas formas de desigualdade social”, afirma Thaís. A taxa mais alta, segundo a pesquisadora, sugere que homens negros idosos vivem ou viveram contextos de maior exposição à violência em relação a outros grupos.
No recorte por gênero, mulheres negras também foram as maiores vítimas de homicídio no país, com 2.662 vítimas em 2023 -68,2% dos casos. Estes números, segundo o Atlas, mostram efeitos estruturais do racismo sobre esses grupos na população.