Hospitais projetam freio nos investimentos em 2025

JOANA CUNHA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Os planos de investimento dos hospitais privados devem sofrer um freio neste ano, provocado não só pelo alto patamar dos juros mas também pela deterioração no relacionamento com as operadoras de planos de saúde.

A previsão é da Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados), que relata preocupação com o avanço das chamadas glosas, prática usada pelas operadoras para questionar parte das cobranças emitidas por hospitais pelos atendimentos prestados aos clientes dos planos de saúde.

Segundo Antônio Britto, diretor-executivo da associação, o aumento das glosas está prejudicando o fluxo de caixa dos hospitais.

A retenção dos investimentos já começou a dar sinais em um levantamento realizado com 94 hospitais associados da entidade em novembro, quando mais de 40% das instituições ouvidas relataram que as dificuldades de fluxo de caixa as levaram a fazer investimentos menores do que os volumes planejados para 2024.

No setor hospitalar, os principais investimentos envolvem expansão de leitos, UTIs, equipamentos e melhores condições de acesso para os pacientes.

A glosa é comum na relação entre as operadoras e as instituições hospitalares. A medida é usada quando a operadora quer apurar algum detalhe ou eventual suspeita sobre uma cobrança.

O problema é que a parcela das faturas glosadas, que historicamente costumava girar entre 3% e 4,5% da receita líquida total, disparou, conforme os dados da Anahp.

Em novembro de 2024, o indicador da entidade que aponta o volume de faturas inicialmente glosadas ultrapassou 16% em 2024. A escalada começou a chamar a atenção em 2023, quando tal indicador chegou a 12%.

Na época, o salto foi atribuído ao aumento do escrutínio dos planos de saúde para combater fraudes em um momento de crise do setor, quando as operadoras registraram um prejuízo operacional bilionário, impulsionado por diferentes motivos, desde os procedimentos represados na pandemia até o avanço de medicamentos de alto custo.

Britto afirma que, em 2024, os hospitais esperavam queda das glosas, e não aumento, porque a situação geral dos planos de saúde melhorou. Os dados da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) relativos ao acumulado até o terceiro trimestre do ano apresentam um lucro operacional de R$ 3 bilhões das operadoras médico-hospitalares, após dois anos de prejuízo na mesma base de comparação.

“A melhora na situação das operadoras não se refletiu nos hospitais. Só piorou o volume de glosa. Isso estabelece algo difícil de entender e de aceitar. Quando a situação era ruim, a glosa se explicava. Então, há um desejo por parte dos hospitais, para 2025, de que isso seja alterado. Nós precisamos que as operadoras tenham lucro, nós dependemos delas, mas esperamos uma postura diferente em relação aos hospitais”, diz Britto.

Nem todas as faturas glosadas terminam com o pagamento negado pelas operadoras ao final do processo de avaliação mais aprofundada da cobrança. Apesar da disparada dos questionamentos para a glosa inicial, a parcela de glosa final teve pouca alteração, permanecendo em torno de 1,5%, segundo a Anahp.

Isso significa que os hospitais continuam recebendo em quase 100% dos atendimentos prestados, mas o processamento de um volume maior de faturas represadas pela glosa tem gerado preocupação em relação ao fluxo de caixa das instituições.

De acordo com o levantamento da Anahp, mais de 80% dos hospitais relatam piora na situação das glosas aplicadas nas contas e no prazo para recebimento.

“Nós defendemos que a glosa tem de existir. Todo pagador tem o direito de, antes de pagar a conta, discordar de algo e questionar. A glosa é parte da regra do jogo. Mas quando você glosa 16% no primeiro minuto e conclui, depois de reexaminar, que menos de 2% tinha problema, nós estamos diante de uma estratégia financeira. É uma estratégia que retém recursos”, diz Britto.

Procurada pela reportagem, a Abramge, associação que reúne empresas de plano de saúde, afirma que desconhece a existência de qualquer prática de glosa indevida de pagamentos por parte das operadoras de planos de saúde. A entidade diz também que se trata de uma relação individual entre as empresas e seus respectivos fornecedores.

“Segundo dados públicos da própria ANS, o tempo médio de pagamento, em dias, do total de procedimentos realizados caiu em 2024 na comparação com 2023, o que demonstra um esforço constante das operadoras na avaliação de eventuais glosas administrativas do setor”, diz a Abramge em nota.

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