Justiça manda Prefeitura de SP mudar nomes de ruas e espaços ligados à ditadura militar

Juiz da 3ª Vara da Fazenda Pública da Capital reforçou importância do ‘direito à memória política’ como alicerce da democracia e da dignidade humana. Segundo ele, a omissão prolongada do poder público fere princípios constitucionais. Ruas de São Paulo homenageiam nomes ligados à ditadura
A Justiça de São Paulo determinou que a prefeitura da capital altere nomes de ruas e espaços públicos que homenageiam figuras relacionadas à ditadura militar. A decisão atende uma ação civil pública movida pelo Instituto Vladimir Herzog e pela Defensoria Pública da União.
De acordo com a decisão da 3ª Vara da Fazenda Pública, apesar de leis municipais e recomendações da Comissão Nacional da Verdade, o município ainda mantém inúmeros logradouros e equipamentos públicos com denominações que reverenciam personagens ligados à repressão política e violações de direitos humanos.
A princípio, a prefeitura terá o prazo de 60 dias para que os seguintes endereços tenham o nome alterado:
Crematório Municipal de Vila Alpina – por homenagear o diretor do Serviço Funerário do município de São Paulo que dá nome ao crematório, “pessoa controversa porque viajou à Europa para estudar sistemas de cremação em momento coincidente com o auge das práticas de desaparecimento forçado”;
Centro Desportivo na Rua Servidão de São Marcos (Zona Sul) – por homenagear um general chefe do CIE (Centro de Informações do Exército);
Marginal Tietê/Avenida Presidente Castelo Branco (Zona Norte/Centro) – Marechal de Exército, foi o primeiro presidente da República após o golpe militar;
Ponte das Bandeiras (Zona Norte/Centro) – Nome da via foi alterado para homenagear ex-diretor do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), órgão da repressão política durante a ditadura);
Rua Alberi Vieira dos Santos (Zona Norte) – Colaborador do CIE, envolvido em repressão violenta.
Rua Dr. Mario Santalucia (Zona Norte) – Médico-legista envolvido em laudos necroscópicos fraudulentos.
Praça Augusto Rademaker Grunewald (Zona Sul) – Vice-presidente durante o período mais repressivo da ditadura.
Rua Délio Jardim de Matos (Zona Sul) – Militar e um dos principais articuladores do golpe de 1964.
Avenida General Enio Pimentel da Silveira (Zona Sul) – Associado ao DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna) e a práticas de tortura.
Rua Dr. Octávio Gonçalves Moreira Júnior (Zona Oeste) – Delegado envolvido em torturas e ocultação de cadáveres.
Rua 31 de Março (Zona Sul) – Data que marca o golpe de 1964.
Os autores da ação destacaram que a Lei Municipal nº 15.717/2013 e o Decreto Municipal 57.146/16, que instituiu o Programa Ruas de Memória, já permitiam a mudança dos nomes, mas, ainda assim, o poder público se omitiu na aplicação da norma.
“Apesar da ampla estrutura jurídica que lhe dá legitimidade, o direito à memória política de fato apresenta pouca ressonância nas políticas públicas”, apontou o juiz.
“Portanto, ao se considerar que há mais de dez anos o Poder Público municipal é omisso quanto ao início de renomeação desses espaços públicos em cumprimento ao direito à memória política que se associa ao regime democrático e à dignidade da pessoa humana, justifica-se a tutela de urgência solicitada”, explicou.
O juiz Luís Manuel Fonseca Pires reforçou a importância do “direito à memória política” como alicerce da democracia e da dignidade humana. Segundo ele, a omissão prolongada fere os princípios constitucionais e legais que embasam o Estado democrático de Direito.
Em nota conjunta, o instituto e a Defensoria afirmam que “a decisão judicial reconhece a importância da preservação da memória histórica e da justiça de transição como instrumentos para consolidar os valores democráticos e prevenir a repetição de violações de direitos humanos” e “representa um avanço significativo no enfrentamento aos legados autoritários no Brasil”.
Procurada, a Prefeitura de São Paulo não encaminhou posicionamento até a última atualização desta reportagem.
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