Forrozeiros desbravam o interior de SP para difundir versão tradicional do ritmo criado no Nordeste


No Dia Nacional do Forró, g1 conta história de grupo de Campinas que leva o tradicional forró pé de serra para festas e apresentações. Banda formada por três nordestinos e um sudestino leva forró pé de serra para interior de SP
Para quem conhece os sons inconfundíveis da zabumba, do triângulo e da sanfona, é quase impossível não pensar na energia vibrante das festas nordestinas. Mas é em Campinas (SP) que uma banda busca difundir a versão mais tradicional do ritmo, conhecido como pé de serra, para conquistar corações mesmo longe das raízes culturais.
Formada em 2015 por três nordestinos e um paulista, o conjunto conta com bom humor das experiências vividas no interior de São Paulo e das dificuldades para difundir e exaltar os clássicos do gênero – que chega a ser confundido com sertanejo (descubra abaixo).
Nesta sexta-feira (13) é celebrado o Dia Nacional do Forró e, para entender os desafios que o ritmo enfrenta, o g1 conversou com músicos e pesquisadores.
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Forró além do Nordeste ☀️
Segundo Samuel Quintans, cordelista há 41 anos, a história do forró no Sudeste remonta às décadas de 1960 e 1970, quando nordestinos deixaram as terras natais em busca de trabalho e carregaram as próprias tradições com eles.
Com o êxodo de nordestinos para a região Sudeste, nomes como Luiz Gonzaga, conhecido como o “Rei do Baião”, e Jackson do Pandeiro conseguiram levar o forró para fora do Nordeste.
Para Samuel, o fato de o ritmo ser agradável ajudou a cultura nordestina a se expandir. “Luiz Gonzaga se lançou para cá também nessa vinda dos nordestinos, né? Nos anos 70, você tinha uma força de trabalho muito grande do nordestino que vinha tentar a sorte na cidade grande, né?”, conta o cordelista.
“O forró é um ritmo extremamente social, no qual as comunidades se unem, festejam. Não precisa de muito para um forró. Um terreiro de chão batido é mais que suficiente, né? Um triângulo, uma zabumba e uma sanfona, resolve o problema”, conta Samuel.
Músico, pesquisador formado pela Unicamp e estudioso da cultura nordestina há 13 anos, Gilber Souto Maior avalia que, embora exista uma receptividade ao gênero em São Paulo, o maior desafio é justamente alcançar aqueles que não têm contato direto com nordestinos ou suas tradições.
Diferentemente do que ocorre com o sertanejo ou com o pagode, que costumam estar presentes em qualquer evento, o forró tradicional muitas vezes fica restrito às festas típicas, famílias ou aos espaços voltados à celebração da cultura nordestina. Resumindo: às vezes é difícil sair da bolha.
“Existe uma abertura no estado de São Paulo. Ele é um estado que abre as portas quando você chega com uma boa proposta, com coerência. Agora, eu acho que o pontapé inicial disso aí, são justamente as pessoas não são nordestinas que moram no estado ou são pessoas que são filhos deles, ou parentes, ou então pessoas que têm amigos nordestinos”, diz Gilberto.
O forró tradicional no interior de SP 💃
Banda de forró em Campinas (SP) foi criada em 2015
Estevão Mamédio/g1
Com o objetivo de manter viva a essência do forró autêntico, a banda Forró Maria Lua completará 10 anos de história em 2025. O grupo é um dos responsáveis por levar o forró pé de serra a Campinas e região com uma proposta de levar a tradição nordestina no cenário musical de São Paulo.
Josivaldo Moraes é percussionista, zabumbeiro e fundador da banda, que já teve outra formação, e conta que o grupo começou após ser convidado por um bar da cidade para realizar um evento. “Até lá não tinha o grupo, não existia. Aí fiz uma reunião com ele (dono do bar), saí da reunião e montei o grupo”, conta Josi, como é conhecido.
Hoje, a banda conta com o acordeonista e vocalista Artur Ferreira, Alan Lacerda no triângulo, e Dudu Baradel no cavaquinho, e já enfrentou desafios para conquistar seu público – especialmente em um mercado musical que, segundo eles, muitas vezes prioriza sonoridades mais comerciais.
“Nosso som, a gente toca o forró pé de serra. A gente toca o forró autêntico. A gente mantém viva a tradição do autêntico, que é o forró pé de serra. Luiz Gonzaga, Jackson, Silvério Pessoa, Dominguinhos, Trio Nordestino. Esse é o tipo de forró que a gente toca”, conta Artur.
É forró ou sertanejo? 🤔
Além da dificuldade de viver apenas da música, o grupo detalha que um de seus maiores desafios é, justamente, explicar que forró e sertanejo não são a mesma coisa. Artur Ferreira, inclusive, relembrou o momento em que foi contratado para realizar um show, mas o cliente acabou confundindo os dois estilos musicais.
“Eu até frisei para a pessoa. Disse: ‘olha, eu toco o Dominguinhos, Elba Ramalho, Trio Nordestino’. Cheguei lá, comecei a tocar, aí a pessoa veio: ‘não, mas eu quero forró’. Eu falei: ‘mas eu tô tocando forró’. O forró que ele estava falando era Gino e Geno, Teodoro e Sampaio. Não chegou a ser um preconceito, mas um erro de comunicação”, relembra o músico.
Segundo Artur, nem todos os espaços estão preparados para um forró tradicional, mas a experiência do grupo permite identificar o público certo para cada show, ajustando o repertório de acordo com a casa e o público.
“Mas o forró é sempre agradável, sempre funciona. Pelo menos a experiência que a gente tem. Acho que muito difícil alguém que está na noite, que saiu para dançar, que saiu para curtir, se você tocar um forró, e essa pessoa não vai curtir. Eu acho que é praticamente impossível isso acontecer,” finaliza o vocalista.
Banda de forró de Campinas (SP) completa 10 anos no próximo ano
Estevão Mamedio/g1
Desafios para disseminação 🌵
Apesar de ser reconhecido como patrimônio cultural imaterial do Brasil, as bandas do forró tradicional ainda enfrentam, segundo Samuel Quintans, dificuldades para que o ritmo seja tratado como uma manifestação artística nacional, e não apenas regional.
“Existe um engano muito grande nessa premissa de que é a ‘cultura nordestina’, o forró ‘nordestino’, ou é o ‘vanerão gaúcho’. São culturas brasileiras. É a cultura do Brasil. Então, se nós reconhecermos o forró como uma cultura brasileira, oriunda do Nordeste, que está dentro de um país chamado Brasil, a gente quebra essa barreira”, relata Samuel.
O músico acredita que essa barreira não é quebrada porque, quando há regionalização, como muitas vezes ocorre com o forró, ela é distanciada da cultura e, indiretamente, se torna apenas folclore (ou seja, algo restrito a um povo e distante da população geral).
*Estagiária sob supervisão de Yasmin Castro.
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