A caminho do Rubicão

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Donald Trump está a poucas semanas de voltar à Casa Branca. Com Joe Biden encerrando o mandato – rei morto, rei posto –, Trump foi a estrela da reabertura da Catedral de Notre-Dame, em Paris, marcando seu primeiro compromisso internacional como presidente eleito. Lá, encontrou-se com Emmanuel Macron e Volodymyr Zelensky, ensaiando conversas para o fim da guerra – só falta, literalmente, combinar com os russos.

No plano doméstico, Trump já definiu os principais nomes de sua equipe. Dois se destacam por encarnarem as prioridades do novo presidente: Marco Rubio, no Departamento de Estado, sinaliza um foco renovado dos EUA na América Latina e de pressão sobre a China; Scott Bessent, no Tesouro, destaca o protecionismo econômico que busca redesenhar as regras do comércio internacional.

Rubio, senador pela Flórida em seu terceiro mandato, de origem cubana e conhecido por sua militância anticomunista, é visto como a autoridade mais experiente em questões latino-americanas desde os anos 1970. Sua nomeação reflete como as prioridades de Trump – controle da imigração, combate às drogas e rivalidade comercial com a China – passam pela América Latina.

No campo econômico, Bessent, o nomeado para o Tesouro, representa a vertente mais sofisticada do nacionalismo econômico trumpista. Professor de história econômica em Yale, fez carreira e fortuna ao lado de George Soros, figura execrada pela direita anti-globalista. Ainda assim, Bessent não é o típico representante do MAGA. Aproximou-se de Trump quando sua aposta ainda parecia arriscada, porém percebendo, intrigado, que as batalhas judiciais não enfraqueciam o ex-presidente, antes insuflavam seu apelo popular. “Ele era como uma ação de empresa que valoriza, mesmo diante de más notícias”, afirmaria depois.

Apesar do apoio de Wall Street, o respaldo a Scott Bessent vem mais de sua visão crítica sobre a dívida pública dos EUA, que já ultrapassou US$ 34 trilhões – mais de 120% do PIB. Para ele, a janela de crescimento que pode frear essa trajetória está se fechando. Diante disso, Bessent propõe três metas até 2028: crescimento de 3% ao ano, redução da dívida pública em 3% e aumento na produção de petróleo em 3 milhões de barris por dia. Cortes de impostos e desregulamentação completam o pacote.

Para o quase futuro Secretário do Tesouro, tarifas não representam apenas arrecadação. São ferramentas para reconstruir a base produtiva dos EUA. Questionado sobre o impacto inflacionário, é categórico: pagar mais caro é o preço a pagar. Na visão de Bessent, produtividade e indústria forte são fenômenos inseparáveis. A globalização produtiva, voltada para ganhos rápidos, foi um erro estratégico. Em áreas-chave, ele defende uma política industrial audaz, que garanta a liderança dos EUA.

Por ser personagem tão diferente dos padrões políticos habituais, Trump suscita mais incógnitas do que certezas. O horizonte reserva meses de surpresas e desafios em várias frentes.

João Marcelo Chiabai da Fonseca, advogado, consultor e mestre em Políticas Públicas pela Escola de Estudos Internacionais Avançados (SAIS) da Universidade Johns Hopkins

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