Fósseis de fezes e restos de vômito contam ascensão dos dinossauros

REINALDO JOSÉ LOPES
SÃO CARLOS, SC (FOLHAPRESS)

Para entender a origem dos dinossauros, paleontólogos europeus decidiram levar às últimas consequências o ditado “você é o que você come”. Analisando fezes e restos de vômito com mais de 200 milhões de anos, eles conseguiram reconstruir detalhadamente as cadeias alimentares da época da ascensão dos dinos.

O processo, de acordo com eles, pode ser descrito como uma expansão segura, lenta e gradual do grupo dos dinossauros, que começam pequenos e oportunistas, sem se destacar muito entre os demais répteis, e vão aumentando gradualmente de tamanho, ganhando proeminência graças a mudanças no clima e na vegetação.

A inusitada análise saiu nesta quarta-feira (27) no periódico científico Nature e tem como principais autores Martin Qvarnström e Grzegorz Niedźwiedzki, ambos ligados à Universidade de Uppsala, na Suécia (Niedźwiedzki também trabalha no Instituto Geológico Polonês, em Varsóvia).

A dupla e seus colegas estudaram os fósseis da chamada Bacia Polonesa. Essa subdivisão geológica da Europa centro-oriental é importante justamente por abranger boa parte do período de surgimento e diversificação dos dinossauros, com rochas que vão do meio do Carniano (230 milhões de anos antes do presente) até o começo do Hettangiano (200 milhões de anos atrás).

Suecos e poloneses, junto com colegas na Noruega e Hungria, tiveram acesso a mais de 500 bromálitos, como são conhecidos os restos fossilizados do conteúdo do sistema digestivo, já excretado ou não. Isso inclui tanto fezes quanto o que ainda estava no estômago ou no intestino do bicho no momento de sua morte, além dos chamados regurgitálitos (vômito fóssil).

A preservação dos bromálitos permite, é claro, estimar quais animais e plantas estavam virando almoço, já que é possível detectar a presença de coisas como pedaços de folhas, grãos de pólen, escamas (de peixes ou de animais terrestres) e ossos das espécies devoradas. Além disso, o tamanho e o formato das fezes petrificadas trazem pistas sobre o responsável pela excreção.

Tais informações foram combinadas com o que se sabe sobre ossos fossilizados e pegadas de animais na mesma região e época para traçar um retrato das relações ecológicas entre os animais da Bacia Polonesa ao longo do tempo.

Existem algumas coisas relativamente comuns em todas as fases analisadas pela equipe -por exemplo, a importância dos peixes como fontes de alimento para diferentes grupos de predadores, e a capacidade predatória de um subgrupo dos peixes, os tubarões, ainda muito importantes nos ecossistemas atuais.

Por outro lado, as transformações graduais, que os cientistas subdividiram em cinco fases evolutivas, ajudam a enxergar como os dinossauros se diversificaram e se tornaram o grupo dominante entre os vertebrados terrestres.

Nas fases 1 e 2 do “plano” (obviamente involuntário) de conquista do planeta, eles são só apenas mais um grupo de onívoros de pequeno porte, pouco numerosos e generalistas em seus hábitos. Nessa época, dividiam a região com anfíbios de grande porte e com cauda, répteis herbívoros gorduchos que pareciam pequenos hipopótamos e parentes dos crocodilos que comiam plantas.

Nas fases 3 e 4, alguns dos dinos primevos se tornam predadores de médio porte e surgem os primeiros herbívoros do grupo, que vão ficando cada vez maiores, enquanto os concorrentes vão desaparecendo paulatinamente. Por fim, a fase 5 corresponde à ascensão dos sauropodomorfos -herbívoros imensos e quadrúpedes, de pescoço longo- e ao aparecimento de superpredadores de grande porte que passam a caçá-los.

É possível que a chave para essa transformação tenha sido a mudança climática por volta da fase 3, com um aumento da umidade que levou ao surgimento de uma vegetação densa e diversificada, semelhante à das florestas tropicais de hoje. Para confirmar a ideia e o modelo das cinco fases, serão necessários mais estudos -inclusive no Brasil, que abriga uma rica fauna de dinossauros primitivos.

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