Banda de heavy metal do Recanto das Emas denuncia violências contra povos indígenas em 3 línguas

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Por Alex Mapurunga, Arthur de Carvalho, Eliza Felix, Evelyn Vieira e Hugo Bemerguy 

Guitarras, baixos, bateria, berimbau, viola caipira e cantos indígenas. A banda Arandu Arakuaa é uma mistura singular, integrando o heavy metal à sonoridade dos povos originários e outros elementos tradicionais brasileiros.

Criada em 2008, no Recanto das Emas, região a cerca de 32 quilômetros do Plano Piloto, a banda luta contra o apagamento dos povos indígenas cantando em três línguas, tupi, xavante, xerente.

Essência

A banda cujo o nome significa “sabedoria do cosmos” em tradução livre Tupi-Guarani, é referência ao escritor indigena Kaká Werá,  e é uma afirmação da essência da música. 

A banda é composta por quatro  integrantes:  Guilherme Cezário, graduado em música pela UnB, e que toca guitarra para a banda desde 2018; junto com João Mancha, o baterista. Nos vocais e no baixo, Andressa Barbosa, e o fundador da banda, Zândhio Huku, na segunda guitarra e na viola caipira. 

O baterista João Mancha, natural de Belém (PA), diz que o que o atraiu para ser integrante da banda foi a identidade que o grupo trás da cena do heavy metal.

“A proposta já era disruptiva desde o início. Cantar em tupi, xavante, xerente. Isso mexe com a estrutura do que se entende por rock”, destaca.

Ele diz que a banda desafia a convencionalidade, com instrumentos inusitados como maracá, ocarina, berimbau, pau-de-chuva  e sons de pés  com os clássicos do rock.

“É difícil entregar esse som ao vivo, tamanha a diversidade sonora”, diz João.

A idealização desse projeto cultural vem de Elizândio, conhecido como Zândhio, natural do interior do Tocantins e de ascendência indígena. Mestre em Educação pela UnB, ele atua como pedagogo e pesquisador.

A paixão por música não se limita ao heavy metal “Eu queria ser cantor de MPB, mas o metal era mais acessível. E, mais do que estilo, o metal sempre me pareceu mais democrático”, destaca.

O gênero musical foi uma maneira inusitada de se impor na cena musical.

Para Zândio, o preconceito contra a música indígena e a ausência de investimento são reflexos do apagamento histórico sofrido por esses povos.

“Nossa existência é resistência”, frisa.

Demoraram 3 anos para a banda começar a tocar em shows ao vivo e, desde então, o grupo divulga o trabalho com o repertório 100% autoral.

Em 2014, além de já terem tocado em festivais importantes como o Ferrock (DF) e o Porão do Rock (DF), já era apontada como maior representante do metal indígena no Brasil, conforme o Whiplash – maior portal de rock e metal do país.

Falta de patrocínio

A afirmação de identidade e essência é um dos maiores atos políticos da banda. A unicidade sonora causou estranhamento e o vocal com cânticos foi alvo de críticas e chacota.

A reação do público revela um preconceito velado pela falta de familiaridade com a cultura indígenas. Ao decorrer do tempo, a consolidação da banda venceu esse estranhamento inicial e conquistou uma legião de fãs com estética fora do esperado do heavy metal.

Andressa, vocalista e baixista da banda, também simboliza a resistência. Mulher em um espaço majoritariamente masculino, ela já sofreu preconceito dentro da cena do metal. Apesar da trajetória sólida e da proposta única, a banda ainda enfrenta silenciamento.

“Não somos chamados para premiações ou eventos culturais, mesmo quando nossa proposta se encaixa perfeitamente”, lamenta o baterista João.

O próprio público, fiel, costuma marcar a banda em postagens que tratam de cultura indígena ou rock nacional, cobrando visibilidade. 

Quando perguntados sobre como querem ser lembrados, a resposta é unânime: pela ancestralidade, identidade e luta.

“Nosso som é autoral, mas mais do que isso, é uma manifestação espiritual e política”, diz Zândhio. Para ele, a essência do grupo está na conexão com a terra e na defesa do meio ambiente: “É uma luta para continuar vivendo nesse planeta”, reforça.

Sob supervisão de Isa Stacciarini e Luiz Cláudio Ferreira

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