Dólar fecha em queda e Bolsa em alta após susto com o IOF e tarifas de Trump contra a União Europeia

VITOR HUGO BATISTA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Após chegar a subir mais de 1% pela manhã, o dólar fechou a sessão desta sexta-feira (23) com uma leve queda de 0,26%, a R$ 5,6455. Já a Bolsa encerrou com um avanço de 0,40%, a 137.824 pontos, revertendo a abertura mais negativa, quando chegou a despencar até 1,50%, indo abaixo dos 135 mil pontos na mínima do pregão.

Em uma sessão marcada por alta volatilidade, investidores reagiram ao recuo do governo Lula em relação a parte das medidas de aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) em operações cambiais. Os movimentos também tiveram como pano de fundo a ameaça do presidente dos EUA, Donald Trump, de tarifar os produtos da União Europeia em 50%.

Na semana, a divisa norte-americana acumulou queda de 0,38%, enquanto a Bolsa soma perdas de 1,12%.

Na quinta (22), com o mercado à vista de câmbio já fechado, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) baixou um decreto para aumentar o IOF de uma série de operações de câmbio e crédito de empresas, com previsão de arrecadação de R$ 20,5 bilhões em 2025 e R$ 41 bilhões em 2026. Também foi divulgado o congelamento de R$ 31,3 bilhões de despesas do Orçamento deste ano.

As mudanças leveram o dólar futuro a acelerar antes de seu fechamento, às 18h. Diante dessa repercussão negativa no mercado financeiro, o governo chamou uma reunião de emergência ainda na noite de quinta e decidiu rever dois pontos da medida sobre o IOF, estabelecendo alíquota zero sobre aplicações de fundos de investimentos do Brasil em ativos no exterior.

Antes de recuar, o governo havia previsto uma alíquota de 3,5% sobre essas aplicações. A mudança deve reduzir o ganho de arrecadação em aproximadamente R$ 6 bilhões até 2026.

Na madrugada desta sexta, antes da abertura dos mercados, um novo decreto foi publicado em edição extra do Diário Oficial da União. Mesmo com o alívio das medidas, as primeiras negociações desta sessão ainda refletiam as incertezas dos investidores com o cenário fiscal do governo.

“Foi um pânico tão generalizado, tão generalizado, que a Fazenda teve que revogar algumas medidas”, afirmou Alison Correia, analista de investimentos e com-fundador da Dom Investimentos.

“Voltaram atrás em relação aos fundos, por que quem vai querer diversificar os seus investimentos lá fora? Uma das poucas defesas que a gente tem é conseguir diversificar os nossos investimentos alocando também em moedas mais fortes de mercados internacionais.”

Ao longo do dia, o dólar desacelerou alta com o mercado absorvendo o fato de que o Ministério da Fazenda voltou atrás na medida cambial mais sensível, que era a cobrança de IOF em aplicações de fundos de investimento no exterior.

Em entrevistas a jornalistas em São Paulo na manhã desta sexta, Haddad afirmou que o governo não tem problema em corrigir rota, “desde que o rumo traçado pelo governo seja mantido”, após a pasta recuar de parte das medidas do IOF.

Segundo noticiou a Folha, a decisão de recuar também foi motivada pelo receio de que o episódio pudesse repetir a experiência traumática da crise do Pix, em janeiro, quando a disseminação de fake news sobre o tema prejudicou a popularidade do presidente.

As operações com cartões de crédito e débito internacionais, cartão pré-pago internacional, cheques de viagem para gastos pessoais, cuja alíquota passou de 3,38% para 3,5%, serão mantidas.

OPERAÇÕES INTERNACIONAIS

De acordo com o estrategista Felipe Paletta, da EQI Research, a decisão do governo de voltar atrás, principalmente na pauta do IOF para investimentos, trouxe bastante alívio, assim como a comunicação do governo de que não era intenção em nenhum momento qualquer tipo de controle de capitais.

“Houve uma recuperação mais sincronizada ao longo do dia e o Ibovespa apresentou um desempenho melhor”, disse.

Na perspectiva de Matheus Spiess, analista da Empiricus Research, o recuo do governo reforça a impressão de desorganização e falta de direção clara. “Isso mostra que não há muito norte, está realmente bagunçado.”

Segundo Spiess, embora o bloqueio de despesas anunciado pelo governo tenha superado as expectativas do mercado, a forma como o aumento do IOF foi implementado acabou ofuscando essa notícia positiva.

“O governo conseguiu transformar uma notícia boa em um desastre, porque surpreendeu positivamente no tamanho do contingenciamento e do bloqueio, que superou os R$ 30 bilhões, mas veio junto com essa notícia do IOF”, disse. Segundo ele, a decisão do aumento do IOF veio como uma “bomba” e uma “péssima sinalização”, disse.

Para Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Pine, o aumento do IOF demonstra que o governo não está disposto a fazer um ajuste fiscal pela ótica de corte de gastos, mas pelo aumento de arrecadação de impostos, o que torna a medida uma ferramenta rápida, porém controversa, para o ajuste fiscal.

“Embora contribua para o equilíbrio fiscal, o uso do IOF como instrumento arrecadatório cria precedentes problemáticos e amplifica a percepção de incerteza tributária, especialmente num contexto em que os ajustes fiscais recaem cada vez mais sobre elevação da carga tributária”, afirmou.

Na perspectiva de Pedro Moreira, sócio da One Investimentos, o fato de nenhuma dessas medidas relacionadas ao IOF serem negociadas com o Banco Central demonstram uma falta de diálogo com a autoridade monetária.

No cenário internacional, a tarifação dos Estados Unidos contra a União Europeia esteve no radar dos investidores.

Isso porque o presidente dos EUA, Donald Trump, disse nesta sexta que está recomendando uma tarifa de 50% sobre produtos da União Europeia a partir de 1º de junho, afirmando que a negociação comercial coma UE tem sido difícil.

A medida escalona a guerra comercial com o bloco apenas duas semanas depois de os EUA concordarem com a China em reduzir tarifas em um pacto que confortou investidores globais.

Caso se confirme, a tarifa de 50% seria mais do que o dobro da taxa que o presidente dos EUA anunciou para a UE em seu autoproclamado Dia da Libertação em 2 de abril.

Diante disso, o cenário externo era de queda do dólar ante quase todas as demais divisas.

O DXY, que mede a força do dólar frente a uma cesta de outras seis divisas fortes, caiu 0,89% ao fim do pregão.

Já os principais índices de Wall Street caíam nesta sexta-feira. Segundo dados preliminares, o S&P 500 perdeu 0,69%, para 5.801,92 pontos. O índice de tecnologia Nasdaq recuou 0,98%, para 18.740,82 pontos. O Dow Jones caiu 0,59%, para 41.612,99 pontos. O indicador de volatilidade de Wall Street VIX, o “índice do medo”, atingiu a máxima de mais de duas semanas, subindo mais de 10,0%.

“A abertura de mais frentes na guerra comercial foi exatamente o que os investidores não precisavam e isso claramente pegou a maioria desprevenida”, disse Steve Sosnick, analista-chefe de mercado da Interactive Brokers.

“Não está claro o que motivou essas declarações, mas elas são emblemáticas do tipo de volatilidade para a qual devemos estar sempre preparados.”

Trump também ameaçou a Apple com uma tarifa de 25% sobre todos os iPhones vendidos nos EUA que não sejam fabricados no país.

“Essa última ameaça é pior do que o pior cenário possível”, disse Fiona Cincotta, analista sênior de mercado da City Index.

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