JOÃO GABRIEL E MARIANNA HOLANDA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
Aprovado no Senado na noite de quarta-feira (21), o projeto de lei que flexibiliza e simplifica o licenciamento ambiental já é prioridade da bancada ruralista na Câmara dos Deputados. O texto deve avançar ainda neste semestre na Casa, mantendo um novo mecanismo apadrinhado pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).
Como revelou a Folha, Alcolumbre emplacou no texto uma emenda que cria a Licença Ambiental Especial (LAE), nova categoria na qual o governo poderá classificar empreendimentos como estratégicos para que haja uma tramitação mais simples do licenciamento, independentemente do risco ambiental –o que pode beneficiar, por exemplo, a exploração de petróleo na Foz do Amazonas.
O projeto de lei chega de volta à Câmara, onde a tramitação começou –fora aprovado na Casa em 2021.
Como o Senado promoveu alterações no texto, ele deve ser apreciado novamente pela Câmara e, se aprovado, segue para sanção do presidente Lula (PT).
Os deputados podem acatar as mudanças feitas pelos senadores ou rejeitá-las, mas não podem trazer mais inovações.
A proposta é uma das prioridades da bancada ruralista, o grupo mais poderoso do Congresso Nacional atualmente, que quer aprová-la até julho, antes do recesso legislativo do meio do ano.
Caso isso ocorra, o grupo sacramentaria mais uma derrota à ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, crítica ferrenha do projeto. Ela ficou isolada dentro do governo Lula enquanto ministérios como da Agricultura e dos Transportes defenderam a proposta.
“A FPA [Frente Parlamentar da Agropecuária, representante da bancada ruralista] trabalhará para aprovar a Lei Geral de Licenciamento Ambiental neste primeiro semestre. É pauta prioritária para destravar o país”, afirma o presidente do grupo, Pedro Lupion (PP-PR).
A proposta também tem apoio de outras frentes parlamentares, como a do Empreendedorismo, do Cooperativismo e do Biodiesel. Quase 100 entidades do setor privado, inclusive a Confederação Nacional da Indústria (CNI), também endossaram o projeto.
Parlamentares ouvidos pela reportagem avaliam que a emenda emplacada por Alcolumbre traz ainda mais polêmica para um texto que já é polêmico. Como a Câmara tende a ter uma postura ainda mais contrária a dos ambientalistas, porém, o trecho deve ser mantido.
O tema ainda não entrou na agenda oficial da Câmara dos Deputados, nem foi discutido durante a reunião dos líderes desta quinta-feira (22), quando foi definida a pauta de votações da próxima semana.
O líder do PT, Lindbergh Faria (RJ), adotou um tom crítico ao texto e defendeu que o projeto passe pelas comissões.
“Nossa avaliação é que vai ser um retrocesso gigantesco. Então nós vamos resistir, queremos discutir muito no mérito. Vamos tentar impedir que que levem regime de urgência”, disse, após reunião de líderes.
“Eu sei que tem uma articulação grande, mas a ideia nossa é que um projeto como esse, pelo impacto que vai ter, não seja votado assim”, completou.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), por sua vez, se limitou a dizer que o cronograma de votação do texto deve ser feito na próxima semana.
O calendário até o fim do semestre é curto por causa da festas de São João e do feriado de Corpus Christi. Assim, haverá apenas duas semanas de trabalho em julho antes do recesso.
Há a expectativa que Hugo Motta converse com Alcolumbre nos próximos dias para definir quem será o relator da matéria.
A senadores, segundo relatos ouvidos sob reserva pela Folha, o parlamentar amapaense afirma que quer um nome que mantenha o texto como ele saiu de sua Casa, e gostaria se fosse do Norte –sua região e que foi beneficiada por uma outra emenda, que dá prioridades para empreendimentos realizados lá.
A praxe seria devolver ao relator inicial da Câmara, que foi Neri Geller (PP-MT), que não é mais deputado. Então, um de seus principais articuladores era Kim Kataguiri (União Brasil-SP), que já se candidatou a assumir o posto desta vez.
Além de ser do mesmo partido de Alcolumbre, Kim é ideologicamente oposto aos ambientalistas. Os dois foram vistos pela reportagem conversando no plenário do Senado durante a votação do projeto, na última quarta.
O texto passou anos empacado no Senado mas, como revelou a Folha de S.Paulo, voltou a avançar após se tornar uma prioridade de Alcolumbre. O presidente do Senado vê nele uma forma de pressão política contra Marina Silva para impulsionar a exploração de petróleo na Foz do Amazonas.
O licenciamento é uma análise dos possíveis impactos ambientais para empreendimentos como obras, exploração de petróleo e minérios.
As mudanças previstas podem impulsionar atividades de risco, como a exploração de Foz do Amazonas, a mineração, obras de infraestrutura, do Novo PAC e a BR-319, e enxugam instrumentos de consulta a comunidades afetadas por estes empreendimentos.
Apoiadores defendem que a proposta dá segurança jurídica, unifica a legislação, simplifica processos que hoje se arrastam por anos e dá autonomia a órgãos reguladores municipais e estaduais, beneficiando o desenvolvimento econômico.
Uma nova lei geral para o licenciamento é uma demanda tanto de ambientalistas quanto de setores da indústria e do agronegócio, que concordam que o atual sistema é defasado, mas divergem diametralmente sobre como atualizá-las.