Tiroteio na feira e a entrevista sobre os desafios da Segurança Pública

Hoje não falta estrutura para a PM atuar, mas há grandes desafios a serem enfrentados (Foto: Divulgação)

Horas depois que a secretária estadual de Segurança Pública, Carla Jordanna, concedeu entrevista à Rádio Folha, no domingo pela manhã, quando fez análise do setor em Roraima, apontando avanços, no período da tarde dois homens foram baleados em via pública em um local de grande concentração pública, a Feira do Garimpeiro, por onde passam milhares de pessoas todos os domingos, instalada em um trecho da Avenida Ataíde Teive, que divide os bairros Tancredo Neves e Asa Branca, na zona Oeste.

As informações sobre o tiroteio e a identidade das vítimas foram escassas, mas aquele setor da cidade, especialmente no Tancredo Neves, há tempos está conflagrado pelo tráfico de drogas, que se apossou de toda uma rua paralela à Av. Ataíde Teive. Com aumento do poder de facções venezuelanas, é muito provável que autor e vítimas sejam de nacionalidade estrangeira e que o fato tenha tudo a ver com essa disputa pela venda de droga. Afinal, tentar eliminar desafetos a tiros em via pública é o mesmo modo de operar de grupos criminosos venezuelanos no bairro 13 de Setembro, que está sob o domínio dessas facções.

O episódio na maior feira-livre do Estado em via pública revela a real situação da Segurança Pública. Embora a secretária tenha sido bem enfática ao falar de avanços no investimento e na estrutura, com viaturas policiais, armamento e combustível, refletindo na redução da criminalidade, ela colocou os problemas ampliados pela migração em massa como o grande desafio, o que realmente procede, conforme mostram o tráfico de droga e as facções venezuelanas. No entanto, essa análise merece de mais contextualizações.

Apesar de o Atlas da Violência 2025, divulgado há uma semana, apontar Roraima como o 5º Estado mais violento em ralação a homicídios e campeão em relação à violência contra a mulher, referente ao ano de 2023 em comparação com 2022, é verdade que esses números vêm caindo, conforme insistiu a secretária. Mas a questão é que os números ainda preocupam, ficando acima da média nacional, que também vem sendo reduzida.

Porém, a grande questão é que a reação por parte do Estado tem se mostrado tardia, a exemplo do anúncio positivo anunciado por Carla Jordanna, que foi a instalação do Centro Integrado de Comando e Controle (CICC), que é uma central de comando e monitoramento operando com 103 câmeras de vigilância, cujo investimento alcança os R$ 8 milhões. Não custa lembrar que um projeto de videomonitoramento foi lançado em Roraima há 15 anos e nunca foi executado, se perdendo ao longo dos seguidos governos.

Significa que, nos últimos anos, enquanto o governo ainda tenta ajeitar o que ficou para trás, o crime se organizou e facções venezuelanas se estabeleceram, mostrando seu poderio criminoso no meio da maior feira-livre de Roraima. Do mesmo modo, o grande número de viaturas circulando pela cidade não se traduz em presença efetiva de policiais fora das viaturas em pontos estratégicos, embora com o novo Comando da Polícia Militar tenha sido lançada a Operação Atentos nos municípios do Sul de Roraima, no fim de semana. Até aqui, viu-se um policiamento ostensivo de ar-condicionado.

A questão é que estas operações são pontuais e não se tornam efetivas, em uma política de tolerância zero, conforme foi cobrado por um ouvinte da Rádio Folha. O exemplo disso ocorreu na Capital, quando foi descoberto um cemitério clandestino no bairro Pricumã, em janeiro, e foi desencadeada a Operação Soberania, além de outras no ano passado, quando tudo não passou de uma demonstração de resposta para dar satisfação momentânea à opinião pública. Depois disso, tudo é desfeito e cai no esquecimento até a criminalidade assustar de novo.   

Como a secretária de Segurança é uma coronel da PM, é crível que o assunto não poderia ser aprofundado em relação a crise vivida pela Corporação militar com o então comandante sob investigação pela Polícia Federal por suposta venda ilegal de armas e munições, o qual foi trocado recentemente após forte pressão, além de quase 100 PMs investigados por vários crimes, como formação de milícia, execução por meio de confrontos simulados, assaltos a garimpeiros e outros crimes, revelando um grave problema que precisa ser enfrentado além dos criminosos que ameaçam os poderes constituídos.

Acima de tudo, outra questão é apontada pelo Anuário de Segurança Pública 2024, com base no ano de 2023, que é o investimento na Segurança Pública em relação às despesas das demais searas de políticas públicas, demonstrando que Roraima tem investido mais na priorização desse direito do que aos demais, como habitação, meio ambiente, agricultura, assistência social, ciência e tecnologia, cultura e cidadania. Que fique bem claro que isso não significa que Segurança Pública não seja uma prioridade.

Significa, isto sim, que investir mais em polícia nas ruas, esquecendo outros direitos, não resolve o problema da criminalidade. Em Roraima, as despesas na Segurança Pública em 2023 significaram quase 10% do orçamento do Estado, empenhando recursos na ordem de R$746.229.863,97, conforme o Anuário. Enquanto isso, na Educação, um setor importante para o desenvolvimento da sociedade, ainda temos escolas cobertas com lona. Isso só para mostrar o desequilíbrio entre as prioridades. O fato precisa ser levado em consideração quando se pensa em políticas públicas que não pensem somente em atacar os efeitos, mas também nas causas da violência e da criminalidade.

*Colunista

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