Moradores da região de Perdizes e outros bairros de São Paulo relatam surgimento de escorpiões nas ruas e até mesmo dentro das próprias casas. Um dos casos mais recentes foi no dia 1° de maio. O chef de cozinha Paulo Afonso estava mexendo nas plantas da varanda de seu apartamento, enquanto sua filha e o sobrinho brincavam, quando sentiu uma fisgada.
“Bati a mão, o escorpião caiu no chão, pequeno. Não me atendei em tirar foto, filmar, nada. Doeu bastante na hora. Fui ao banheiro, lavei a mão, tirei o ferrão e achei que seria só uma picada e não ia ocasionar nada.”
A picada ocorreu por volta das 7h. No final da tarde, os sintomas foram se agravando. O braço começou a inchar, ele passou a ter muita febre, ânsia de vômito, suor e oscilação da pressão.
“Cheguei a trocar de quatro a cinco vezes a camisa, de tanto que eu suava. No hospital, perguntaram se eu tinha foto, ou levado o animal, mas a gente fica tão apavorado que nem pensa. Estou à base de antibiótico, fiquei muito mal. Pensei que eu ia morrer. É uma sensação muito ruim”.
Afonso alega que não imaginava que o veneno fosse tão poderoso. “Pensei que não ia dar em nada, não pensei que um bichinho tão pequeno podia me fazer tão mal.” (Veja abaixo como proceder nesses casos)
Ele conta que após o susto, fez uma varredura no apartamento e conversou com o síndico do prédio. A dedetização do edifício estava em dia, mas descobriu que o caso dele não era isolado.
“Não sabemos o que está acontecendo. Mas depois que repercutiu, estou vendo várias pessoas com o mesmo relato na redondeza”, conta.
Por conta dos relatos, a página Perdizes Digital publicou um alerta. “Atenção! Vários relatos de presença de escorpiões na Rua Palestra Itália e transversais, em casas e, também, em andares mais altos de condomínios.”
Em nota, a Secretaria Municipal da Saúde (SMS), por meio da Coordenadoria de Vigilância em Saúde (Covisa), informou que uma equipe da vigilância vai “verificar a situação e tomar as providências necessárias” no local, e afirma que a “Subprefeitura da Lapa executa diariamente serviços de zeladoria para a manutenção da região”.
Zona oeste, norte e centro também registram casos
A reportagem também ouviu relatos da presença de escorpiões na Vila Leopoldina e Vila Romana, na zona oeste, Santa Cecília no centro, no Jaraguá, na zona norte.
“Um dia, ao sair de casa pra trabalhar, me deparei com um pessoal da Prefeitura, que me alertou da presença de escorpião na região”, disse a economista Daniela Donato, moradora do bairro Vila Romana. Por uma questão de sigilo, ela não quis identificar o nome da via. O caso aconteceu em dezembro do ano passado.
Ela contou que uma vizinha, que costuma deixar o carro parado na rua, chamou os técnicos porque tinha encontrado um dos animais no para-brisa do veículo. “Eles fizeram uma varredura, mas disseram não ter encontrado nada”, afirmou. “Mas passaram algumas orientações para deixar os ralos de casa sempre tampados porque os escorpiões menores conseguem passar pelas frestas”.
Andressa Zanini disse que no prédio onde mora, na Santa Cecília, também foi localizado um escorpião no corredor do edifício. “Uma pessoa encontrou e nos mandou uma foto. No dia seguinte, nós dedetizamos.”
Daianny Marotta é síndica de dois conjuntos habitacionais no Jaraguá, na zona norte. Ela afirma que, no começo deste ano, sofreu com o problema.
“Meus condomínios estão sempre com a dedetização em dia, mas, em janeiro, um escorpião entrou em um apartamento do térreo, onde reside um morador cadeirante que, por não ter os movimentos dos braços e das pernas, fica em um colchão no chão”, disse ao Estadão. “A esposa o coloca ali porque é mais fácil para trocá-lo e dar banho”, explicou.
Ela diz que não sabe de onde o escorpião veio. “Ele foi encontrado perto na lavanderia. Mas a gente não sabe se chegou janela pela ou pelo ralo.”
Daianny diz que já abriu protocolos junta à administração municipal sobre a presença de ratos e escorpiões na região, mas que os pedidos não foram atendidos.
No canal SP156, da Prefeitura de São Paulo, o número de chamados de ocorrências envolvendo escorpiões aumentou do ano passado para este. Nos primeiros quatro meses de 2024, as solicitações para “vistoria de local com escorpiões” foi 576, enquanto no primeiro trimestre de 2025, 723 (aumento de 25%).
Vale ressaltar que os números podem sofrer distorções porque há casos em que os pedidos são realizados de forma dupla (via mensagem de celular ou por telefone) para uma mesma ocorrência.
O que diz a Prefeitura de SP
De acordo com os dados da Prefeitura de São Paulo, 200 acidentes envolvendo escorpião ocorridos na capital foram notificados este ano. Ao longo de todo 2024, o número foi de 425 e, em 2023, 442.
A administração não apresentou dados discriminados por distritos, conforme solicitado pela reportagem e também não respondeu quantos acidentes do tipo foram contabilizados no mesmo período nos anos anteriores.
No entanto, considerado a média diária de ocorrências, há um aumento do ano passado (1,16 caso/dia) para 2025 (1,47 caso/dia) Isto é, se a quantidade de casos se mantiver até o final do ano, a capital poderá registrar cerca 536 casos em 2025.
Envenenamento varia de acordo com a espécie
Os acidentes são mais frequentes na primavera e verão, quando há o aumento natural da população destes animais em função do período de reprodução, informa a Secretaria Municipal da Saúde. As picadas acontecem, geralmente, quando o escorpião tem o corpo pressionado e inocula o veneno como forma de se defender.
Os escorpiões são predadores e se alimentam principalmente de insetos, como baratas, e outros invertebrados. Eles possuem veneno e podem inoculá-lo através do ferrão. O quadro clínico do envenenamento varia porque da espécie do animal, a quantidade de veneno inoculado, a idade e a massa corpórea da vítima (veja como proceder em caso de picada, abaixo).
Existem cerca de 2.200 espécies de escorpiões conhecidas no mundo e aproximadamente 160 delas ocorrem no Brasil. Destas, somente três espécies são consideradas de importância em saúde pública para o município de São Paulo, informa a Prefeitura: Tityus bahiensis (escorpião marrom), Tityus serrulatus (escorpião amarelo) e Tityus stigmurus (escorpião amarelo do nordeste).
Onde os animais aparecem no ambiente urbano?
Nas cidades, podem ser encontrados em áreas verdes, como parques, mas também em terrenos baldios, linhas de trem, instalações elétricas, e em meio a materiais de construção e entulhos, informa a Secretaria da Saúde de São Paulo, em seu site.
Na internet, os usuários que moram e frequentam a região da Pompeia e Perdizes se queixam da quantidade de lixo acumulado por conta dos eventos esportivos e culturais que acontecem com frequência na região. Eles questionam também se o excesso de obras no bairro, como a construção da Linha 6-Laranja do Metrô não pode estar interferindo na presença dos peçonhentos.
Como evitar e o que fazer em caso de picada?
A Prefeitura diz que conta com um programa de controle destes animais, além de orientações de medidas preventivas, averiguação e busca ativa de locais onde o aracnídeo é encontrado. “Os agentes realizam vistorias em imóveis e locais com registros de aparecimento, como terrenos, bueiros e outros”.
Para evitar a presença e proliferação de escorpiões, as orientações são:
– Manter a tampa dos ralos internos na posição fechada e abrir apenas para limpeza e enquanto estiver em uso;
– Colocar telas milimétricas nos ralos na área externa;
– Vedar frestas nos muros, paredes e pisos;
– Vedar a soleira das portas com rodinho ou rolinhos de areia;
– Não acumular entulho ou materiais de construção;
– Verificar se os espelhos de luz e pontos de fiação elétrica não apresentam frestas e vãos;
– Manter o ambiente limpo e organizado; acondicionando o lixo em recipientes fechados;
– Manter a limpeza de jardins, sem acúmulo de folhas; providenciar a limpeza e corte do mato em terrenos;
Para evitar acidentes:
– Examinar roupas e calçados antes de usá-los;
– Manter cama, sofás, berços afastados da parede;
– Manter lençóis, cobertores, cortinas sem contato diretamente com o chão;
– Usar luvas grossas ao manusear materiais de construção, na limpeza de jardins ou outros materiais que possam servir de abrigo a escorpiões.
No caso de contato com os animais, a recomendação é limpar o local da picada com água e sabão e não aplicar nenhum tipo de produto.
Na sequência, é necessário procurar o atendimento em uma das unidades de pronto atendimento da rede de saúde ou atendimento especializado nas Unidades de Referência da capital.
Estadão Conteúdo