CATIA SEABRA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
Auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já admitem como real a possibilidade de demissão do ministro da Previdência, Carlos Lupi, em meio à crise provocada por descontos em benefícios do INSS sem a autorização dos aposentados e pensionistas.
Em conversas, o presidente tem demonstrado irritação com o desempenho de Lupi no enfrentamento do problema.
No Palácio do Planalto, a avaliação é que após uma semana de deflagração da crise no INSS, o ministro não conseguiu oferecer soluções para a contenção dos problemas que abalaram a reputação do governo em um momento de recuperação de popularidade do presidente.
Na terça-feira (29), em audiência na Câmara, Lupi defendeu que o INSS não deveria intermediar as relações entre associações para aposentados e beneficiários do instituto. “É mais cômodo [para as associações] o desconto em folha do que ter que ir atrás do aposentado todo mês”, disse.
Para o ministro, nem o credenciamento das entidades associativas deveria ficar com o INSS. “Não sei ainda como encaminhar isso. É uma opinião pessoal. Vou discutir internamente para ver se é opinião majoritária no governo”, explicou.
Um dos exemplos da atual situação de Lupi está no fato de ele não ter apresentado um substituto para o ex-presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, que deixou o cargo após ordem de Lula.
Nesta quarta-feira (30), Lula nomeou o procurador Gilberto Waller Júnior como novo presidente da instituição por indicação do ministro-chefe da AGU (Advocacia-Geral da União) e apoio do ministro-chefe da Controladoria-Geral da União (CGU), Vinicius de Carvalho.
A informação de que Lula nomearia diretamente o novo presidente, sem a intermediação de Lupi, já havia sido anunciada pela ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, nesta quarta.
Em mais uma demonstração de descontentamento com Lupi, Lula deu carta branca para que Waller adote medidas saneadoras, incluindo mudanças na estrutura do INSS. Pesou para a escolha o perfil técnico, descrito como de “xerife”, do novo presidente da instituição.
Ao longo da semana, colaboradores do presidente foram acumulando críticas a Lupi, desde a manutenção de integrantes da velha estrutura do INSS à resistência a exonerar Stefanutto.
Na manhã da quarta, auxiliares do presidente falavam em sobrevida para o ministro. Mas o cenário mudou. Embora Lupi tenha se defendido com firmeza ao falar à Câmara dos Deputados, integrantes do governo reconhecem um problema administrativo na conduta do ministro e afirmam que hoje uma demissão seria uma decisão política, em resposta a uma omissão do chefe da pasta.
Na audiência, Lupi listou as medidas que tomou sobre o assunto desde que assumiu o cargo, como um pedido de auditoria sobre o assunto e mudanças nas regras de concessão, com a exigência de biometria. As ações, no entanto, não foram capazes de conter o problema.
No entanto, como mostrou a Folha, o governo só tomou medidas para conter o aumento de descontos irregulares após auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União), que investigou o tema em 2023.
Auxiliares do presidente têm repetido que não houve, até o momento, provas de envolvimento do ministro no esquema nacional de descontos não autorizados. Lembram ainda que ele é presidente licenciado do PDT, mas o desgaste sofrido com a eclosão da crise fez com que interlocutores do presidente tratem como possível sua exoneração.
A sobrevivência do ministro no governo depende das conversas que o presidente teria a partir desta quarta-feira (30) com os envolvidos nas investigações. Nenhuma audiência constava da agenda oficial, mas o presidente está coletando dados para a tomada de sua decisão.
O governo terá que avaliar o fluxo de informações recebidas pelo ministro e o ritmo de respostas dadas por sua pasta. Um colaborador do presidente lembra que Lupi não era a sua primeira escolha para o cargo, mas, sim, o secretário-executivo da pasta, Wolney Queiroz.
Aliados do presidente enfatizam que a investigação foi uma iniciativa do governo Lula, bem como a adoção de providências para ressarcimento de eventuais vítimas do esquema.
No dia 23 de abril, a PF e a CGU realizaram a operação Sem Desconto, para combater a suposta fraude em descontos de aposentadorias e pensões. Entre 2019 e 2024, a soma dos valores descontados de benefícios do INSS por diversas associações chega a R$ 6,3 bilhões, mas ainda será apurado qual porcentagem foi feita de forma ilegal, segundo as investigações.
Segundo a PF, com um único alvo, foram apreendidos vários carros, como uma Ferrari e um Rolls Royce, avaliados em mais de R$ 15 milhões. Com outro, US$ 200 mil e, com um segundo, US$ 150 mil. Também foram apreendidas joias e quadros.
As investigações focaram entidades de classe, como associações e sindicatos, que formalizaram Acordos de Cooperação Técnica (ACT) com o INSS.
Esses acordos permitem que elas realizem descontos de mensalidades associativas diretamente na folha de pagamento dos beneficiários do INSS, desde que autorizados pelos aposentados e pensionistas.
Uma auditoria feita pela CGU identificou que muitas não tinham estrutura operacional para prestar os serviços que ofereciam aos beneficiários, como descontos em academias, convênios com planos de saúde e auxílio funerário.
Também verificou que 72% não tinham entregue a documentação completa ao INSS. Onze foram alvo de medidas judiciais.