BRUNA FANTTI
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS)
As duas maiores facções criminosas do Brasil, PCC (Primeiro Comando da Capital) e CV (Comando Vermelho) encerraram uma aliança que incluía pacto de não agressão entre integrantes do dois grupos. As informações sobre o rompimento circularam ao longo do dia em mensagens atribuídas às facções e foram confirmadas por um advogado que defende integrantes do Comando Vermelho.
A cisão foi confirmada à reportagem por advogados que tem clientes na facção fluminense, que estiveram no Complexo de Bangu, na zona oeste do Rio de Janeiro, nesta terça-feira (29).
A trégua foi noticiada inicialmente pelo jornal O Globo e pelo site Metrópoles, e confirmadas pela Folha de S.Paulo. Embora ainda não tenham ocorrido mudanças concretas no sistema prisional, pedidos de transferência de detentos devem começar em breve, segundo os defensores.
Ainda de acordo com os advogados, alguns internos já tinham conhecimento prévio do rompimento. No entanto, a maioria dos presos foi oficialmente informada após a oração das 18h, momento reservado também para comunicados das lideranças nas unidades prisionais do CV.
A ruptura entre as facções ocorreu de forma pacífica e teria sido motivada por dois fatores principais. O primeiro deles foi a reprovação, por parte de integrantes do PCC, de práticas violentas atribuídas ao Comando Vermelho.
Um exemplo citado foi o assassinato de um turista de Brasília, que, antes de ser morto, teria sido forçado a comer partes do próprio corpo -como orelhas e dedos- por supostamente portar em seu celular fotos ligadas a uma facção rival.
Em comunicado obtido pela reportagem por intermédio de advogados, o PCC afirmou não compactuar com a morte de inocentes.
O segundo motivo do rompimento teria sido o compartilhamento de rotas para o tráfico de drogas e armas, o que gerou tensões entre os grupos. Informações de inteligência apontam que a ordem de rompimento da aliança teria partido de Márcio Nepomuceno, o Marcinho VP, apontado como uma das principais lideranças do Comando Vermelho.
A advogada de Marcinho VP, Flávia Froes, negou essa versão.
“Essa informação é falsa e fruto de conjecturas falaciosas, sem qualquer fundamento. Márcio está incomunicável na Penitenciária Federal de Campo Grande, onde todas as visitas -inclusive de familiares e advogados- são gravadas e monitoradas em tempo real pelo sistema penitenciário e pelo setor de inteligência do Senappen, em Brasília”, afirmou Froes.
Na avaliação de pessoas que acompanham o tema em Brasília, apesar de a cúpula ter proposto essa trégua, o que aconteceu na rua foi diferente: os membros não se entendiam e não conseguiam conviver. Por isso, a parceria não teria dado certo.
Um relatório da Senappen (Secretaria Nacional de Políticas Penais), noticiado no início deste ano, havia apontado indícios de uma possível ação conjunta entre as facções que incluiria o pacto de não agressão.
O objetivo seria coordenar ações entre os dois grupos com o objetivo de pressionar para a flexibilização de regras do sistema federal, como a retomada de visitas com contato físico, incluindo as íntimas, entre detentos e seus familiares.
O relatório da Senappen foi elaborado a partir de conversas gravadas nos parlatórios entre advogados e presos, com autorização judicial. Líderes de alto escalão das facções, como Marcola, chefe máximo do PCC, e Marcinho VP, um dos principais nomes do CV, estariam à frente da coordenação dessas ações conjuntas.
A disputa mais violenta entre as duas facções teve como marco a morte do traficante Jorge Rafaat Toumani, em 2016, que teria sido planejada pelo PCC.
O Brasil tem 88 organizações criminosas mapeadas, segundo levantamento da Senappen com base nas informações levantadas nos presídios de todo o território nacional no ano passado. As duas maiores, PCC e CV conseguiram expandir a presença no sistema prisional nos últimos anos e atuavam em 25 unidades da federação.