LEONARDO FUHRMANN
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Menos de um mês e meio depois de um protocolo interno enviado pelo então subprefeito da Sé, o coronel Álvaro Camilo, para a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), a gestão Ricardo Nunes (MDB) iniciou, nesta segunda-feira (28), as obras de implantação de estacionamento embaixo do viaduto Presidente João Goulart, o Minhocão, no centro de São Paulo.
A medida foi anunciada na semana passada, pelo vice-prefeito, o coronel Mello Araújo, como forma de combater o acúmulo de lixo debaixo da via elevada. Ele também citou -em entrevista à coluna Mônica Bergamo- objetos que permanecem no local em razão da presença de pessoas em situação de rua.
Em toda a extensão da rua Amaral Gurgel, o projeto prevê 16 vagas no sentido centro e outras nove no sentido bairro. As primeiras foram construídas no trecho entre as ruas Major Sertório e General Jardim, no sentido centro.
O vice-prefeito tem tratado a instalação na região como um projeto-piloto que pode ser replicado nos outros trechos.
No entanto, a ciclovia, que liga quem desce da avenida Paulista pela rua da Consolação ao largo do Arouche, já foi apagada em toda a Amaral Gurgel. Mesmo apagada, ela seguia sendo usada por cicloentregadores na manhã desta terça, quando a reportagem foi ao local.
Em documento de 14 de abril, a CET faz uma série de ressalvas ao projeto. Em primeiro lugar, aponta que as duas vias são arteriais, ou seja, são fundamentais para sistema viário nos deslocamentos de grandes distâncias. Por isso, o acesso a endereços locais não é prioridade da via.
Diz ainda que não há melhorias viárias previstas nas duas ruas e que elas poderiam ser tratadas dentro do projeto de desativação do Minhocão, incluída no Plano Diretor. Para a manutenção da ciclovia no local, destaca ser inviável um estacionamento de 45 graus, como cogitado. O impacto no trânsito também seria maior, alertou o órgão.
Outro problema é que ciclovia passará a ser bidirecional (uma única via com dois sentidos de circulação). A situação, segundo a avaliação técnica, é mais complicada no trecho das avenidas São João e General Olímpio da Silveira, onde a via para bicicletas foi construída em 2015, com o traçado adaptado a partir do corredor de ônibus que liga o centro aos bairros da Lapa e Pirituba, na zona oeste.
Além de o canteiro ser mais estreito, o trecho de ciclovia já é dividido em trechos mono e bidirecional justamente para não haver conflito entre os ciclistas e os pedestres que embarcam nos ônibus. A companhia de trânsito aponta apenas dois trechos onde seria possível fazer um corredor longitudinal. E sugere mais estudos antes de uma implementação.
Em nota, a gestão Nunes afirma que “o projeto de um bolsão de estacionamento será implantado inicialmente de forma experimental em somente um trecho sob o viaduto (Minhocão) para avaliação de viabilidade”.
Diz ainda que a ciclovia será mantida e que, nos sentidos bidirecionais, terá a medida equivalente às duas pistas atuais. “Também será implantada uma área reservada para pedestres sobre o canteiro central, com um metro de largura, localizada entre as baias de estacionamento e a ciclovia”, afirma.
O trecho construído, segundo a prefeitura, comporta quatro carros, e, “depois da conclusão das obras, nos próximos dias, a estrutura cicloviária será reimplantada e sinalizada”.
Contrários à medida, os vereadores Nabil Bonduki (PT) e Renata Falzoni (PSB) entraram na tarde desta terça com uma ação popular contra a criação dos bolsões. Nela, argumentam que a criação de novas vagas fere a legislação de mobilidade urbana, que incentiva o favorecimento do transporte público e a mobilidade ativa. Os políticos também chamam a ideia de higienista, por expulsar as pessoas em situação de rua do espaço.
O temor é que a medida só provoque um novo espalhamento das pessoas em situação de rua pelas proximidades, assim como aconteceu quando houve o fechamento da cracolândia. Afirma também que faltam informações sobre o custo da obra.
Relator do Plano Diretor, Bonduki diz que a medida é um retrocesso no projeto de mobilidade da região central e nos avanços urbanísticos das últimas décadas. Para ele, o estacionamento causa mais problemas e não ajuda os moradores em nada.
“O número de vagas é irrisório, o uso para estacionamento deve gerar mais trânsito e dificilmente as pessoas se sentirão seguras a parar seus carros lá”, afirma.
Renata afirma que a medida foi tomada sem qualquer debate com os usuários da ciclovia e
moradores e comerciantes da região. “O problema de descarte de lixo é resolvido com fiscalização e fazer com que a lei seja cumprida. Não dá para tirar mais espaço das pessoas e entregar para os carros”, diz.
A vereadora também entrou com um requerimento na Comissão de Trânsito, Transporte e Atividade Econômica da Câmara para que solicite informações da Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes e a Subprefeitura da Sé sobre a construção dos bolsões e os estudos prévios.