Por Renato Cunha Lima
Em 2019, o Brasil assistiu ao lançamento de uma ofensiva contra fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que custavam bilhões aos cofres públicos. A iniciativa partiu de uma sugestão do então Secretário Especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, hoje senador pelo Rio Grande do Norte. Sob o comando do Ministério da Economia, Marinho propôs medidas para revisar benefícios com indícios de irregularidades e coibir descontos indevidos em aposentadorias e pensões. A ideia ganhou forma na Medida Provisória (MP) 871/2019, formalmente proposta pelo presidente Jair Bolsonaro em 18 de janeiro de 2019, conforme exige a Constituição Federal.
A MP 871/2019, apelidada de “pente-fino do INSS”, trouxe mudanças significativas. Além de criar programas para revisar benefícios e oferecer bônus a servidores que identificassem fraudes, a medida instituiu a exigência de revalidação, a cada três anos, das autorizações para descontos associativos em benefícios previdenciários. Essa regra visava impedir que entidades descontassem valores de aposentados sem consentimento, uma prática que alimentava esquemas fraudulentos. Após intensa tramitação no Congresso, a MP foi aprovada e convertida na Lei nº 13.846/2019, sancionada por Bolsonaro em 18 de junho de 2019. Marinho, principal articulador, celebrou a economia projetada de R$ 9,8 bilhões em 12 meses.
A regra da revalidação trienal funcionou como um obstáculo a fraudes, mas sua história deu uma reviravolta em 2022. Durante a tramitação da MP 1.107/2022, que originalmente tratava de microcrédito digital para empreendedores, um dispositivo estranho ao tema original – conhecido como “jabuti” – foi inserido no texto. Esse jabuti revogou a exigência de revalidação dos descontos associativos, facilitando a retomada de práticas fraudulentas. A manobra legislativa ocorreu na Câmara dos Deputados, sob relatoria do deputado Luis Miranda (Republicanos-DF), e foi aprovada em votação simbólica, sem registro individual dos votos.
A articulação para incluir o jabuti teve o Partido dos Trabalhadores (PT) como protagonista. Pressionado por associações de aposentados e entidades sindicais, o PT liderou o lobby para eliminar a revalidação, alegando que a regra era burocrática e prejudicava filiados de organizações legítimas. Deputados petistas, com apoio de partidos como PSB, PDT e União Brasil, garantiram a aprovação do texto na Câmara em julho de 2022. No Senado, a relatora Margareth Buzetti (PP-MT) defendeu o texto sem alterações, e a votação, também simbólica, ocorreu em agosto de 2022, convertendo a MP na Lei nº 14.431/2022.
A revogação da regra antifraude, aprovada sem grande alarde, teve consequências graves. Investigações da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União (CGU), como a Operação Sem Desconto, revelaram que a mudança abriu brechas para esquemas que geraram prejuízos de quase R$ 8 bilhões entre 2016 e 2024, com 64% das fraudes ocorrendo após 2022. O caso expôs a vulnerabilidade do sistema previdenciário e levantou críticas à articulação do PT, embora não haja provas de que o partido tivesse intenção de facilitar fraudes. Parlamentares do PT defendem que a revogação buscava atender demandas de aposentados, mas o impacto negativo da medida alimentou debates sobre a responsabilidade legislativa.
Enquanto Rogério Marinho, hoje senador, vê sua iniciativa de 2019 ser desmontada, a revogação do mecanismo antifraude permanece como exemplo de como “jabutis” legislativos podem comprometer políticas públicas. A história da MP 871/2019 e sua alteração em 2022 reflete os desafios de equilibrar interesses políticos e a proteção do sistema previdenciário brasileiro.
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