Governo vê falta de transparência em criação de lei antidesmatamento da Europa

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ANDRÉ BORGES

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

A elaboração da nova lei antidesmatamento que passará a vigorar na União Europeia tem sido acompanhada com preocupação pelo governo brasileiro, que acusa o bloco de países de falta de transparência na definição das regras que passarão a vigorar a partir de janeiro de 2026.

A Comissão Europeia anunciou no último dia 15 de abril um pacote de medidas para “simplificar” a aplicação da lei que promete endurecer as normas ambientais para quem vende aos europeus, impondo medidas como rastreabilidade de produtos agrícolas e florestais comercializados na Europa, como carne, soja, café, borracha, cacau e madeira.

A Divisão de Política Agrícola do Ministério das Relações Exteriores enviou uma análise crítica sobre o tema aos ministérios da Agricultura e Pecuária e do Desenvolvimento Agrário, entre outras autoridades, chamando a atenção para a falta de clareza sobre as decisões.

O Itamaraty diz que já começou a conversar com outros países exportadores, como a Indonésia, para tentar pressionar a União Europeia a dar mais clareza sobre as decisões.

Até 30 de junho, os europeus vão categorizar os países, entre eles o Brasil, como de baixo, médio ou alto risco de desmatamento. Ocorre que, segundo o Itamaraty, não houve uma consulta transparente ao Brasil ou a outros exportadores. Se o Brasil for classificado como “alto risco”, pode enfrentar barreiras mais severas para exportar produtos.

O Itamaraty também alerta sobre a falta de diálogo prático e concreto sobre as discussões técnicas que definirão regras cruciais sobre acesso ao mercado europeu, sugerindo, inclusive, reuniões com demais países exportadores. “Cabe ser melhor apurada a referência à consulta aos estados membros, eles próprios sujeitos ao sistema de classificação de risco”, afirma o ministério.

O pacote de medidas anunciado no dia 15 pela UE pretende reduzir o ônus burocrático para empresas europeias que importam produtos, o que tem impacto direto nas relações com os vendedores brasileiros. Como são alterações administrativas, elas não dependem de aprovação do Parlamento ou do Conselho da União Europeia.

As medidas anunciadas incluem a possibilidade de grandes empresas europeias poderem usar um mesmo documento de rastreamento ambiental, se um produto já tiver sido exportado. Um único representante de determinado grupo empresarial poderá fazer a declaração por várias empresas, reduzindo o retrabalho.

Outra mudança prevê que, em vez de ter que fazer uma declaração toda vez que um produto entrar na Europa, as empresas poderão fazer essa liberação só uma vez por ano.

A estimativa é de que essas mudanças possam gerar uma redução de até 30% nos custos administrativos para empresas europeias. Para o Itamaraty, no entanto, essas alterações só beneficiam as grandes corporações, deixando de fora os pequenos operadores e, especialmente, pequenos e médios produtores de países exportadores, como o Brasil.

Questionado sobre o assunto pela Folha, o Desenvolvimento Agrário declarou que “a consulta pública da União Europeia sobre o tema está aberta até 13 de maio” e que “o governo do Brasil conduzirá discussões internas e se manifestará oportunamente”.

Essa consulta pública foi proposta pela Comissão Europeia, para ajustar e esclarecer o escopo dos produtos que serão abrangidos pela lei. O setor de couro, por exemplo, representado por entidades como a Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de Calçados) e o CICB (Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil), enviou uma carta à presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, solicitando a exclusão desse mercado das novas regras.

O Ministério da Agricultura não respondeu ao pedido da reportagem até o fechamento deste texto. A FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), que representa a bancada ruralista no Congresso Nacional, também não se manifestou sobre o assunto. Em momento anteriores, a FPA já criticou as medidas europeias.

O Brasil busca ter um instrumento legal que permita ao país responder com celeridade caso seja submetido a medidas protecionistas que gerem impacto no comércio internacional. Para evitar ruído político, o tema tem sido tratado com discrição pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Uma das opções em discussão é um projeto de lei em tramitação no Senado de autoria do senador Zequinha Marinho (Podemos-PA).

O texto prevê tornar obrigatório que países e blocos econômicos cumpram padrões ambientais compatíveis aos adotados no Brasil para a venda de bens e produtos no mercado doméstico. A expectativa é que haja “tratamento recíproco entre as nações no comércio internacional.”
A Lei de Produtos Livres de Desmatamento da Europa entrará em vigor a partir de 30 de dezembro de 2025, para médias e grandes empresas. No caso de micro e pequenas empresas, a data prevista é 30 de junho de 2026. Os dois prazos foram adiados em um ano, após pressões de países exportadores, como o Brasil, e setores industriais europeus, que pediram mais tempo para se adaptarem às novas exigências.

As regras definidas até agora exigem que os exportadores devem comprovar que seus produtos não têm origem em áreas desmatadas após 31 de dezembro de 2020. É preciso, ainda, apresentar uma “declaração de diligência”, com informações como geolocalização das áreas de produção e conformidade com as leis do país de origem.

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