O Aprendiz: polêmico filme sobre Trump explora a anatomia da hipocrisia

Apesar de estar em cartaz desde a última semana, O Aprendiz, polêmico filme sobre a ascensão empresarial de Donald Trump, quase não chegou às salas de cinemas. O longa fez sua estreia no Festival de Cannes em maio deste ano e, desde então, tem sido alvo de boicotes. Advogados do ex-presidente dos Estados Unidos chegaram a intimar a produção, solicitando que a obra (já pronta) não fosse lançada. Não é necessário mais do que 30 minutos para entender o porquê de toda essa campanha contrária – que acontece, justamente, às vésperas das eleições presidenciais.

Dirigido pelo iraniano-dinamarquês Ali Abbasi, conhecido principalmente pelo bom Holy Spider, O Aprendiz é uma biografia bastante crítica sobre uma das figuras mais influentes e controversas da história recente dos Estados Unidos. O longa retrata o crescimento de Trump enquanto empresário e se dedica, principalmente, a explorar a influência que o advogado Roy Cohn teve na construção da questionável personalidade do ex-presidente.

Ainda que faça referência óbvia ao programa apresentado pelo empresário, o título do filme é também reflexo do que Trump foi em seus primeiros anos no mundo dos negócios: um aprendiz. Com Roy na condição de advogado e mentor, Donald não apenas aprendeu a ser quem é como, também, importou trejeitos e comportamentos que o tornaram essa figura que, até certo ponto, existe, hoje, como voz e representação de uma parcela “conservadora” dos EUA.

Em O Aprendiz, Abbasi explora a anatomia da hipocrisia que permeia a vida de Trump enquanto empresário e principal liderança da extrema direita norte-americana – mesmo que não se estenda ao período da sua vida política. O filme enxerga o ex-presidente não como figura autêntica, como tantas vezes autoproclamada, mas sim como a cópia de seu mentor – estando sempre mais próximo do plágio do que do original.

Historicamente, o nome de Trump foi moldado ao lado de adjetivos que ressaltaram a sua autenticidade. Mas o longa trabalha na direção contrária, buscando desconstruir qualquer percepção de originalidade. O jeito agressivo de se comunicar, a máxima de não reconhecer derrota, negar a verdade e até mesmo as sessões de bronzeamento são apresentados como traços de personalidade importados de Roy.

Sebastian Stan está bem no papel de Trump e se transforma junto com a personalidade de seu personagem. Maria Bakalova, que interpreta a ex-esposa do empresário, Ivana, idem. Mas o grande destaque é Jeremy Strong, que entrega um Roy Cohn tão desprezível e inquestionável quanto melancólico em diferentes fases da vida.

O principal acerto de O Aprendiz está em não tentar fazer da vida de Trump um espetáculo, por mais luxuosa que ela tenha se tornado. Ainda que seja uma biografia, o longa não faz das conquistas empresariais da vida de Donald motivos de glória. Na verdade, explora cada decisão e comportamento questionável que permeiam o crescimento do empresário. O filme também sabe onde parar, com um ex-presidente já lapidado aos moldes de seu mentor e característico o suficiente para compreender a sua atuação futura na política.

O longa, no entanto, se atrapalha em algumas decisões visuais para contextualização de época. A tentativa de adotar uma estética pseudodocumental em certos momentos, como se Succession se passasse nos 70 e 80, funciona mais como distração do que como um interessante recurso narrativo. O Aprendiz tenta, de diversas maneiras, não ser uma biografia tradicional – mas não obtém muito sucesso nessa empreitada.

Nota: 3.5 / 5

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O Aprendiz está disponível nos cinemas. Confira o trailer:

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