Houve um tempo em que o futebol candango era sinônimo de arquibancada vazia. Literalmente. Em Sobradinho, no início dos anos 80, fui cobrir um jogo sem nenhum torcedor presente. Ninguém! Para registrar o borderô, o então presidente da Federação, Wagner Marques, precisou comprar dois ingressos do próprio bolso. Era o mínimo necessário para que o jogo tivesse um relatório oficial.
Outra cena, tão surreal quanto real: estádio Mané Garrincha, imponente como sempre, mas com apenas 12 torcedores espalhados por arquibancadas que podiam receber 20 ou 30 mil pessoas. Eram tão poucos que entrevistei todo o público pagante. A matéria, de tão inusitada, acabou premiada com o Troféu ABCD, um dos mais importantes da imprensa esportiva local.
É fato que a maioria da população brasiliense ainda torce para clubes do eixo Rio-São Paulo — com destaque absoluto para Flamengo e Corinthians. Mas essa realidade já começa a mudar. Hoje, o futebol local tem torcidas próprias. E torcidas apaixonadas. Brasiliense e Gama protagonizam a maior rivalidade do Distrito Federal. A polarização entre os dois é forte. Há provocação, disputa, estádios cheios. E isso é sinal claro de identidade. De pertencimento. De paixão enraizada.
A rivalidade entre Gama e Brasiliense faz bem para os dois clubes. Um puxa o outro para cima. Crescem juntos. Estão em constante desafio. Ah, sim, é importante lembrar que a final do Candangão, semanas atrás, entre Gama e Capital, levou 37 mil pessoas ao Mané Garrincha.
Não por acaso, hoje, o Campeonato do DF oferece a terceira maior premiação do Brasil entre os estaduais — atrás apenas de São Paulo e Goiás. A evolução é nítida. Da escassez total à valorização dos vencedores. Vários clubes da capital já frequentaram a Série A do Campeonato Brasileiro. Alguns, inclusive, deixaram marcas importantes.
E como não lembrar da façanha do Brasiliense que em 2002 chegou à final da Copa do Brasil? O adversário era o poderoso Corinthians. Tudo indicava que o título já tinha dono. Mas não foi fácil, não. O Corinthians ganhou no Morumbi (2 x 1), e o jogo da volta terminou empatado em 1 x 1. Dida (sim, ele mesmo, o goleirão da Seleção Brasileira) andou fazendo alguns milagres pra segurar o resultado pro Timão. Ah, antes que eu esqueça, tinha quase 30 mil pessoas na Boca do Jacaré.
É verdade que o futebol de Brasília ainda não é o que se espera de uma das regiões com maior renda per capita do país. Mas está em construção. Cresce ano após ano. E tende a se tornar um polo importante no cenário nacional. Prova disso foi o jogo da Seleção Brasileira, contra a Colômbia, mês passado, pelas Eliminatórias Sul-americanas. Mais de 70 mil pessoas no Mané Garrincha. O maior público do futebol brasileiro em 2025 até agora.
Definitivamente, Brasília mudou; o futebol também.