Mudanças climáticas atingiram novos patamares em 2024, destaca relatório da ONU

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GIULIANA MIRANDA
MADRI, ESPANHA (FOLHAPRESS)

A concentração de CO2 e de outros gases de efeito estufa atingiu o nível mais elevado dos últimos 800 mil anos, o nível do mar está subindo em ritmo acelerado, e a última década registrou os dez anos mais quentes da história. O novo relatório da OMM (Organização Meteorológica Mundial), vinculada à ONU, apresenta uma série de dados climáticos alarmantes.

Segundo o documento, divulgado na noite desta terça-feira (18), os sinais claros das mudanças climáticas atingiram novos patamares em 2024, com algumas consequências sendo irreversíveis por centenas ou até milhares de anos.

O relatório também confirmou que 2024 foi o ano mais quente da série histórica, além de ter sido o primeiro a registrar uma temperatura média global superior a 1,5°C em relação à era pré-industrial.

De acordo com os cientistas da entidade, a temperatura média global em 2024 foi de aproximadamente 1,55°C acima da média registrada de 1850 a 1900.

Na apresentação do relatório, o diretor de serviços climáticos da OMM, Chris Hewitt, chamou a atenção para a sequência de anos com recordes climáticos: todos os anos da última década estão entre os dez mais quentes da série histórica.

“Se considerarmos os dez anos mais quentes já registrados, cada um dos últimos dez anos está nessa lista. Isso nunca aconteceu antes”, ressaltou.

Outro ponto destacado pelos pesquisadores foi o ritmo acelerado de aumento das temperaturas dos oceanos. Até agora, cerca de 90% do aquecimento do planeta foi absorvido pelos oceanos.

Em 2023, a temperatura dos oceanos atingiu o nível mais alto em 65 anos de registros observacionais. De 2005 a 2024, a taxa de aquecimento dos oceanos foi mais que o dobro da observada de 1960 a 2005.

O aumento das temperaturas nas águas tem uma série de consequências, que vão desde a degradação dos ecossistemas marinhos e a perda de biodiversidade até a intensificação de tempestades tropicais.

O aquecimento das águas contribui ainda, entre outros fatores, para a elevação do nível do mar, que atingiu um recorde histórico em 2024.

De acordo com a OMM, a taxa de elevação do nível do mar mais que dobrou desde o início dos registros por satélite, aumentando de 2,1 mm por ano, de 1993 a 2002, para 4,7 mm por ano de 2015 a 2024.

Como a maioria das megacidades do mundo está localizada em áreas costeiras, os efeitos desse aumento podem impactar diretamente a vida e o sustento de milhões de pessoas.

Devido à alta concentração de gases de efeito estufa na atmosfera e à natureza do aquecimento em curso, esse o aumento das temperaturas nas águas persistirá no longo prazo. “As projeções climáticas indicam que o aquecimento oceânico continuará pelo menos até o final do século 21, mesmo nos cenários de baixas emissões de carbono”, explica o trabalho.

O relatório mostrou ainda que as calotas polares continuam derretendo rapidamente. No Ártico, as 18 menores extensões de gelo marinho ocorreram nos últimos 18 anos. Já na Antártida, as três menores extensões de gelo foram registradas nos últimos três anos.

O ano de 2024 ficou marcado por uma série de eventos climáticos extremos, que destruíram casas, infraestruturas e terras agrícolas, deixando um rastro de prejuízos materiais e sociais. Segundo a OMM, isso resultou no maior número anual de pessoas deslocadas desde 2008.

Além de tufões, ciclones e furacões, o ano foi marcado por secas severas em várias regiões, intensificadas pelo fenômeno climático El Niño.

Embora o recorde de temperatura registrado em 2024 tenha sido influenciado pelo El Niño, os pesquisadores ressaltam que a principal causa do aquecimento do planeta continua sendo a emissão de gases de efeito estufa.

Os pesquisadores da OMM reforçaram que o fato de 2024 ter ultrapassado a barreira de 1,5°C de aquecimento em relação aos níveis pré-industriais -que é a meta preferencial do Acordo de Paris- não significa que esse limite tenha sido definitivamente ultrapassado.

“Embora um único ano acima de 1,5°C de aquecimento não signifique que os objetivos de longo prazo do Acordo de Paris estejam fora de alcance, isso serve como um alerta de que estamos aumentando os riscos para nossas vidas, economias e para o planeta”, afirmou Celeste Saulo, secretária-geral da entidade.

Segundo o relatório, o aquecimento global de longo prazo está atualmente estimado entre 1,34°C e 1,41°C, dependendo do método de análise utilizado, em comparação ao período anterior à Revolução Industrial.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, reagiu ao documento pedindo a ampliação dos esforços globais para limitar o aquecimento global. “Os líderes precisam agir para que isso aconteça, aproveitando os benefícios das energias renováveis baratas e limpas para suas populações e economias, com novos planos climáticos nacionais previstos para este ano”, declarou.

Para Alexandre Prado, líder em mudanças climáticas do WWF-Brasil, “o Brasil, como grande produtor agrícola, precisa enxergar isso como um alerta: a imprevisibilidade climática está afetando lavouras e pressionando a inflação dos alimentos”.

“Sem uma ação climática mais ambiciosa e estruturada, a segurança alimentar da população estará cada vez mais ameaçada, impactando diretamente a economia e aumentando desigualdades”, comentou. A COP30, conferência climática da ONU que será realizada em Belém em novembro, diz, é “o espaço para avançarmos em soluções concretas para enfrentar esse cenário”.

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