Cooperação entre células cancerígenas pode levar a crescimento rápido de tumor, sugere pesquisa

células de câncer de mama

SAMUEL FERNANDES
MARSELHA, FRANÇA (FOLHAPRESS)

Um mecanismo de cooperação entre células cancerígenas colabora para o desenvolvimento mais rápido de tumores, aponta nova pesquisa publicada em fevereiro na revista Nature. Os autores dizem acreditar que, futuramente, impedir essas interações celulares pode ser uma forma de combater cânceres. No entanto, antes disso, é preciso desenvolver melhor esse possível tratamento e considerar que ele pode ser menos relevante para alguns tipos de tumor.

O estudo, realizado principalmente por cientistas associados a instituições em Nova York, partiu da ideia de investigar o comportamento de células entre elas. Pesquisas anteriores já haviam indicado que, no geral, células não se desenvolvem de modo eficiente nem quando estão sozinhas e nem quando estão em um ambiente com um grande número de outras células.

Esse padrão é um indicativo de que células tendem a colaborar entre si e não somente competir. Se fosse somente competição, elas cresceriam rapidamente quando não tivessem outras do mesmo tipo ao seu redor, algo que não acontece.

Então, a ideia foi de entender se essa cooperação celular também ocorre em tumores. Pesquisas sobre isso até já existiam, mas ainda é um tema carente de estudos. Carlos Carmona-Fontaine, do Centro para Genética e Sistemas Biológicos da Universidade de Nova York e um dos autores do novo artigo, aponta que tumores eram vistos como estruturas desorganizadas, com suas células buscando somente o crescimento desenfreado. Atualmente, já se sabe que isso não é bem verdade.

“Há cada vez mais evidências de que tumores são um pouco mais organizados do que pensávamos no início”, afirma.

De certa forma, o estudo de Carmona-Fontaine entra nessa lista de evidências. Ao analisar células cancerígenas de diferentes tumores sólidos, especialmente em um subtipo bastante comum de câncer do pulmão, os pesquisadores observaram um mecanismo organizado de cooperação entre essas células.

Esse método consiste em células do câncer que quebram proteínas encontradas ao seu redor em aminoácidos, uma substância essencial para o desenvolvimento do tumor. Por meio desse mecanismo de cooperação, essas células conseguem acessar aminoácidos e também disponibilizá-los para outras ao seu redor, colaborando para o crescimento do câncer.

Esse método também é a realidade de células não cancerígenas. Além dessa, outra maneira comum de obter aminoácidos é por meio de vasos sanguíneos. Carmona-Fontaine aponta que esse segundo mecanismo é o mais comum para acessar os aminoácidos. Nesses casos, a quebra de proteínas associado a disponibilização de aminoácidos fica em segundo plano, como uma opção a ser utilizada em situações específicas.

No entanto, esse não é necessariamente o caso de todos os tumores sólidos, já que alguns deles “não têm vasos sanguíneos suficientes para todo o câncer porque crescem muito rápido”, explica Carmona-Fontaine. Desse modo, a cooperação entre as células para quebrar proteínas em aminoácidos foi vista como dispositivo importante para o crescimento desses tipos de tumores.

Essa conclusão, inicialmente um mecanismo colaborativo para desenvolvimento de tumores, também pode ser utilizada para combater o próprio câncer. A ideia é trabalhar com um inibidor que impeça esse processo de quebra de proteínas em aminoácidos no organismo humano em geral. Como células normalmente acessam os aminoácidos por vasos sanguíneos, isso não representaria um grande problema para elas, mas somente para as células de tumores sólidos dependentes da cooperação.

Até já existe um inibidor para esse fim, mas ele não tem uma eficácia tão alta em humanos. Uma melhora do efeito desse medicamento no organismo humano é algo que Carmona-Fontaine objetiva estudar melhor no futuro.

Além disso, mesmo que futuramente esse inibidor alcance um alto grau de eficácia, ele provavelmente não será útil para todo câncer. Por exemplo, tumores no sangue, como leucemia, tendem a acessar os aminoácidos por via sanguínea. Desse modo, eles não são muito dependentes do mecanismo de cooperação entre células que o inibidor impediria que ocorra.

“Os tumores podem ainda ter um acesso muito bom à corrente sanguínea. Então, se você inibir esse backup [de quebra de proteínas em aminoácidos], eles ainda assim ficarão bem”, afirma o autor do estudo.

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