Governo prevê lei Rouanet para projetos de infância, festivais e cultura popular

LUANY GALDEANO
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS)

O governo federal se prepara para ampliar a lei Rouanet com linhas de financiamento específicas para projetos voltados à infância, festivais, cultura popular e em regiões próximas às fronteiras do país, de acordo com Henilton Menezes, secretário de Economia Criativa e Fomento Cultural do Ministério da Cultura.

A mudança surge na esteira da nacionalização do programa, com mais investimentos em programas culturais de fora do Sudeste. Em comparação com 2022, o Norte e o Centro-Oeste tiveram aumento de 257,8% e 113%, respectivamente, na captação de recursos.

Apesar dos avanços, a política ainda se concentra na região mais populosa do país. Em 2024, houve recorde de R$ 2,96 bilhões investidos via lei Rouanet. Desses, R$ 2,1 bilhões vieram do Sudeste. Os dados são do Ministério da Cultura.

Segundo o secretário Henilton Menezes, as novas frentes de financiamento visam reduzir essas desigualdades. A pasta já lançou iniciativas similares, como os programas Rouanet Norte, voltado à região de mesmo nome, e em favelas.

O secretário afirma que ainda não há projetos concretos sobre infância, cultura popular ou em fronteiras com previsão de lançamento, mas a pasta tem estudado as possibilidades. Em nota, o Ministério da Cultura diz que não é possível informar detalhes específicos, por se tratarem de programas ainda em desenvolvimento.

Agentes de cultura popular, por exemplo, dificilmente têm acesso a recursos via lei Rouanet, já que têm menos contato com empresários para captar patrocínio, de acordo com Menezes. Hoje, também há poucos projetos dedicados a crianças ou nas divisas do país que consigam um bom aporte financeiro.

“Nas fronteiras do Brasil com países latino-americanos, há um índice de criminalidade muito alto. Então, o presidente Lula nos pediu para desenvolver uma ação para aquela região. Vamos descobrindo nichos que são demandados pela produção cultural e pela sociedade e criando programas que dialoguem com essas demandas.”

De acordo com Menezes, o ministério também estuda desenvolver uma linha de financiamento para festivais anuais de dança, cinema e música. O objetivo seria dar mais longevidade ao patrocínio desses eventos, para que perdure por mais de uma edição.

“Essa é uma linha boa de trabalhar e que está dando resultado, mas é um trabalho lento, porque exige negociação com empresários. Não posso prescindir de entender a dinâmica do próprio empresário, do território onde ele quer atuar e das prioridades que tem junto à política.”

Para especialistas, esse é o maior gargalo do investimento em cultura no país. A lei Rouanet se tornou o principal pilar de fomento ao setor, sobretudo pelos incentivos fiscais. No entanto, como o maior número de empresas está no Sudeste, o aporte financeiro às artes fica concentrado nessa região.

Albino Rubim, professor da pós-graduação em cultura e sociedade na UFBA (Universidade Federal da Bahia), diz que as linhas específicas de financiamento são um esforço válido, mas insuficiente para apoiar artistas menores que vivem em locais distantes dos grandes centros.

Para ele, é preciso variar os mecanismos de investimento para reduzir a dependência de produtores culturais em relação aos patrocínios das empresas.

Essa variedade já é prevista pela lei Rouanet, que também criou o Fundo Nacional da Cultura para fomentar projetos. Tal mecanismo, no entanto, se enfraqueceu diante incentivos fiscais, segundo Rubim, que também integra o Centro de Estudos Multidisciplinares em Cultura na UFBA.

“A concentração é antidemocrática. O esforço do Ministério para desconcentrar é meritório, mas é um equívoco achar que mudando a lei se resolve a questão do financiamento da cultura”, declara.

Em muitos casos, são empresas estatais que financiam iniciativas em regiões de menor densidade populacional, como apoio à política de governo, de acordo com Raphael dos Santos, professor da Faculdade de Educação da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e especialista em políticas públicas de cultura.

Em 2023, a pasta lançou com quatro estatais um edital de R$ 24 milhões para projetos no Norte. No ano passado, a Petrobras e o Ministério da Cultura lançaram um edital público para o setor com o maior aporte de recursos da história, de R$ 250 milhões, pelas leis Rouanet e do Audiovisual. A petroleira é a companhia que deu o maior valor em incentivos no último ano, segundo o ministério.

Mas, entre empresas privadas, o esforço de descentralizar pode não gerar os mesmos resultados. Isso porque, fora dos grandes centros, o público-alvo que os patrocinadores querem atingir cai significativamente.

“A renúncia fiscal exige despertar o interesse da iniciativa privada para investir na cultura e ter como retorno o marketing”, diz o professor Raphael dos Santos. “Então, será que essas empresas vão querer aportar projetos que priorizem um eixo fora do Rio ou de São Paulo?”

Das dez pessoas jurídicas que forneceram maior apoio à lei Rouanet, duas são empresas públicas. Além da Petrobras, o Banco do Brasil ocupa o quinto lugar na lista. A Sabesp, cuja privatização foi concluída em julho do ano passado, está na oitava posição.

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