Com Ralph Fiennes, elenco afinado sustenta o thriller de ‘Conclave’

conclave

SÉRGIO ALPENDRE
(FOLHAPRESS)

Quando um papa morre ou renuncia, o processo para escolher o seu substituto se chama conclave. É basicamente uma reunião secreta entre os cardeais para eleger o nome apropriado à sucessão. A cada dia sem maioria absoluta de algum candidato, uma fumaça preta sai de uma chaminé. Quando surge um eleito, a fumaça é branca.

Em “Conclave”, longa anglo-americano do alemão Edward Berger, temos o que o título e o elenco já indicavam: uma versão mais narrativa, explicativa e por isso convencional de “Habemus Papam”, brilhante filme do italiano Nanni Moretti. Convencional não é necessariamente sinônimo de ruim. O filme de Berger tem seus trunfos.

Em 2011, ano do filme de Moretti, não havia a onda de extrema direita que agora ocupa boa parte do mundo. O diretor então se concentrava na dúvida e no medo daquele que era amplamente favorito. O filme é menos convencional porque mais condizente com o que se costuma chamar de “cinema de autor”, ainda que seja mais palatável em comparação com os trabalhos anteriores de Moretti.

“Conclave” tem outras ambições, sem deixar de ser um filme de prestígio, do tipo que ganha indicação para o Oscar. Para combater a onda extremista, Berger divide o colégio de cardeais entre os de inclinações progressistas, que aceitam o diferente e promovem a diminuição da desigualdade, e os entusiastas de um retorno à velha ordem, quase o desejo de uma nova Inquisição.

Do lado dos progressistas estão os cardeais Lawrence e Bellini, interpretados por Ralph Fiennes e Stanley Tucci. Do outro, um cardeal italiano chamado Tedesco, vivido pelo ótimo Sergio Castellitto.

Correndo por fora estão o cardeal nigeriano Adeyemi, papel de Lucian Msamati, e o ambicioso cardeal Tremblay, interpretado por John Lithgow, entre outros menos cotados. São dois candidatos que Lawrence e Bellini consideram um mal menor perto de Tedesco, mas ambos têm sérias questões para a eleição.

Como quem sabe que a certeza é a maior inimiga da tolerância, Lawrence, encarregado de coordenar o conclave, prega a dúvida como motor da fé, e cita a frase de Jesus na cruz “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” para defender seu ponto de vista. É a maior semelhança entre este filme e o de Moretti. Porque “Conclave” prefere o caminho do thriller, ou seja, paradoxalmente, da certeza.

Na plateia, Bellini fica orgulhoso do companheiro de ideologia, Tedesco se contorce em sua cadeira e alguns cardeais se sentem mais representados pelas palavras do cardeal progressista, a ponto de votarem nele, mesmo contra sua vontade.

Berger tem um desafio e tanto pela frente: tornar esse conclave interessante para o maior número de espectadores. Por isso a opção pelo thriller. Para vencer o desafio, contudo, precisa também do brilho de seus atores.

Nessa questão, o jogo está ganho. Todo o elenco está afinado, com atores e atrizes em interpretações memoráveis, entre as melhores de suas carreiras. Fiennes, principalmente, brilha como Lawrence, o cardeal cheio de dúvidas, que seria favorito caso desejasse o cargo mais alto da Igreja Católica.

Isabella Rossellini, que interpreta a madre superiora, tem um papel importante. Em certo momento, ela é obrigada a contar o segredo que guardava, sobre uma tramoia nada ética de um dos elegíveis, sedento pelo poder.

Aí está o cerne da questão: esse poder estará melhor nas mãos de quem não o deseja. Querer o poder a ponto de fazer de tudo para alcançá-lo, é combustível para corrupção e traições. Lawrence seria o papa ideal porque não quer ser papa. Nem mesmo sabe se quer continuar sendo cardeal.

Após uma demonstração de pequenez de boa parte dos cardeais reunidos, um discurso inesperado trará um novo favorito, o candidato perfeito. E aí o filme entra no terreno perigoso do que se costuma chamar de “lacração”.

Inverossímil? Sim, bastante, o que pode desagradar alguns espectadores. Estamos novamente nesse terreno, poucas semanas após o brilhante, e muito superior, “Jurado Nº 2”.

Mas “Conclave” percorre o caminho da tensão narrativa com alguma habilidade e as interpretações de Fiennes e de um surpreendente Carlos Diehz, no papel do cardeal mexicano Benitez, fazem as inverossimilhanças parecerem bobagens.

CONCLAVE
Avaliação: Bom
Quando: Estreia quinta (23) nos cinemas
Classificação: 12 anos
Elenco: Ralph Fiennes, Stanley Tucci, John Lithgow
Produção: Reino Unido, Estados Unidos, 2024
Direção: Edward Berger

Adicionar aos favoritos o Link permanente.