CPI da Enel na Alesp pediu há 1 ano que Arsesp contratasse agentes para fiscalizar empresas de energia, mas nenhum foi contratado; agência tem 24 fiscais


Ligada ao governo estadual, Arsesp fiscaliza 19 empresas de energia nos 645 municípios paulistas, mas afirma que vem pedindo à Aneel que repactue convênio, enviando mais verba. Repasses da agência federal à SP em 2024 caíram 64%. Funcionário faz reparo em poste de energia no estado de São Paulo.
Divulgação/AES Eletropaulo
Relatório da CPI da Enel da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) recomendou no ano passado que a Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp) – autarquia ligada ao governo do estado – contratasse mais agentes para fiscalizar empresas de energia no estado, mas quase um ano depois, nenhum novo empregado foi contratado para a ampliação desses serviços.
No relatório final da comissão, publicado no Diário Oficial de dezembro de 2023, os deputados da CPI alertaram que a Arsesp tem apenas 24 funcionários para fiscalizar as sete distribuidoras de energia e 12 pequenas permissionárias que prestam serviço nos 645 municípios do estado.
Esses técnicos da agência paulista são responsáveis pela fiscalização das seguintes empresas que operam em SP: Enel, CPFL Paulista, CPFL Piratininga, EDP, Santa Cruz, Elecktro e Energisa.
“Evidentemente o Convênio celebrado entre a ANEEL e a ARSESP é inoperante. Apenas 24 fiscais para todo o Estado de São Paulo são absolutamente incapazes de cobrir e garantir uma fiscalização que possa ser considerada dotada da mínima veracidade e fidedignidade”, disse o documento da CPI.
“A Arsesp deverá prever a ampliação de seus recursos orçamentários provenientes do Tesouro Estadual para ampliação de seu quadro de profissionais, mediante a realização de concurso público para contratação, e de seus recursos materiais e tecnológicos destinados à fiscalização dos serviços de energia elétrica e de saneamento básico”, afirmou o relatório final.
Sessão da CPI da Enel na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), em 2023.
Divulgação/Alesp
Passado quase um ano da recomendação, a Arsesp informou ao g1, por meio de nota, que mantém os mesmos 24 funcionários para dar conta do convênio de cooperação fiscalizatório firmado em 2011 entre a agência paulista e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Segundo a Arsesp, a quantidade atual de fiscais cumpre estritamente o que foi firmado no convênio de cooperação com a Aneel, sendo responsáveis pela fiscalização dos sete grandes contratos do estado na área de distribuição de energia. A agência diz ainda que eles só atuam sob demanda, ou seja, a Aneel delibera as fiscalizações.
“A fiscalização realizada pela Arsesp ocorre por meio de um convênio de cooperação com a Aneel, que é o poder concedente de energia elétrica e a responsável pelo monitoramento das concessionárias de energia. Os 24 técnicos da Arsesp, dedicados especialmente para a fiscalização de energia elétrica, atuam sob demanda e o modelo metodológico da Aneel, cumprindo estritamente o convênio de cooperação, nos sete contratos vigentes no Estado”, disse Arsesp.
Convênio entre Aneel e Arsesp, firmado em 2011 e em vigor até este ano.
Reprodução
Ajustes e pedidos de mais verba
A agência ligada ao governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) diz que desde o início do ano vem solicitando à Aneel ajustes no plano de cooperação para conseguir mais recursos e ampliar o quadro de empregados.
E que um aditivo contratual foi assinado neste mês de outubro para que a agência estadual possa usar recursos próprios para contratar mais funcionários.
“As fiscalizações ocorrem com base nas mesmas diretrizes, ajustadas, no entanto, em conformidade com as particularidades técnicas de cada área de concessão e diretrizes da agência federal. Desde o início deste ano, a Arsesp vem oficiando a Aneel para o aprimoramento do processo regulatório. A Arsesp solicitou à Aneel, diante do orçamento reduzido por parte da agência federal, autorização para utilizar recursos próprios e realizar mais fiscalizações. Este aditivo contratual foi assinado pela agência nacional neste mês”, disse à agência de SP.
Em nota, a Aneel disse que repassou esse ano ao governo de São Paulo R$ 4,5 milhões para que os serviços de fiscalização fossem realizados. O valor é 64% menor que os R$ 12,7 milhões que a empresa pagou à Arsesp no ano de 2023.
No aditivo contratual firmado entre as duas agências, a Aneel deveria ter repassado ao governo paulista pelo menos R$ 8,5 milhões. Esse corte se deu, segundo a agência nacional, em razão de cortes na agência.
“O valor de 2024 foi reduzido em razão dos cortes orçamentários que a ANEEL recebeu”, disse.
Valores repassados pela Aneel à Arsesp
2022 – 10.569.564,55
2023 – 12.759.165,65
2024 – 4.593.095,26
Aditivo contratual entre Aneel e Arsesp que reafirma papel da agência estadual e determina repasse de R$8,5 milhões em 2024.
Reprodução
Fiscalização terceirizada
Embora a concessão de distribuição de energia obedeça a leis e regramento federais, o papel de fiscalização é delegado pela Aneel em todo o país para as agências estaduais onde o serviço é prestado.
Essa ‘terceirização’ da fiscalização é feita através de convênios assinados entre a agência nacional e as estaduais, inclusive com repasse de verba para que essa fiscalização e o cumprimento das metas da agência federal aconteçam.
No caso do convênio entre a Aneel e a Arsesp, o convênio foi assinado em novembro de 2011 entre os diretores gerais das duas agências: Silvia Maria Calou (Arsesp) e Nelson José Hubner Moreira (Aneel). Ele começou a valer em janeiro de 2012.
No convênio, a Aneel delega à agência paulista a execução de atividades complementares de fiscalização, controle dos serviços e instalações de energia elétrica no território de todo o estado de São Paulo.
Vista da subestação da Enel no bairro do Anhembi, na Zona Norte da cidade de São Paulo.
BRUNO ESCOLASTICO/E.FOTOGRAFIA/ESTADÃO CONTEÚDO
Em 2024, Aneel e Arsesp assinaram um aditivo contratual reafirmando a transferência de poder e assumindo a fiscalização do contrato de metas que a agência nacional firmou com todas as concessionárias que atual no estado, inclusive a Enel.
No documento, a agência do governo paulista se compromete a “comunicar oficialmente à ANEEL quaisquer falhas ou irregularidades observadas no cumprimento deste Contrato de Metas”.
O contrato também prevê que a Aneel repasse R$ 8,5 milhões à Arsesp para a execução dessa fiscalização no âmbito estadual.
Quem privatizou a Eletropaulo?
Caminhão da antiga companhia de energia AES Eletropaulo.
Hélvio Romero/Estadão Conteúdo
A antiga Eletropaulo Metropolitana foi criada em 1981 pelo então governador Paulo Maluf (PP), em substituição à Light. A companhia continuou como estatal única a prestar serviços de distribuição de energia em todo o estado de São Paulo.
Em 1998, o então governador Mario Covas (PSDB) desmembrou a empresa em quatro, fatiando os serviços da antiga estatal e abrindo o caminho para a privatização que se deu naquele mesmo ano.
Na ocasião, um dos coordenadores do programa de desestatização do governo tucano era o vice-governador Geraldo Alckmin (PSB), atual vice-presidente da República.
As áreas da capital paulista e a Região Metropolitana continuaram sob a responsabilidade da Eletropaulo Metropolitana, que foi vendida naquele ano para o consórcio Lightgás, que era formado pelas empresas norte-americanas AES Corporation e Houston Industries Energy, a francesa Électricité de France (EDF) e a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), do Brasil.
A chapa Mario Covas e Geraldo Alckmin (PSDB) foi a vencedora da eleição de 1998 e privatizou as estatais de energia do estado de SP.
Reprodução/Redes Sociais
O consórcio recebeu do governo federal a concessão dos serviços na região pelo prazo de 30 anos. Esse prazo vence em 2028.
50% dessa venda para o setor privado foi financiada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que através da BNDESPar cedeu à holding o total de US$ 888 milhões para que o negócio fosse fechado pelo valor mínimo de US$ 1,78 bilhão no leilão da época.
Em contrapartida, o consórcio apresentou parte das ações da empresa como garantia de pagamento do empréstimo que não foi saudado.
Nesse acordo, a BNDESPar ficava com 50% das ações, enquanto a AES Corporation teria 11,46%, a Houston Industries Energy 11,46%, a Électricité de France (EDF) 11,46% e CSN 7,32%, até que o empréstimo fosse pago.
Porém, após a negociação para o pagamento da dívida se arrastar até 2003, a BNDESPar executou a dívida que já estava em U$ 1,2 bilhão e passou a ter metade da AES Eletropaulo, junto com a empresa AES Corporation dos EUA, que comprou a parte das outras sócias em 2001.
Fachada do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
André Telles/BNDES/Divulgação
As duas empresas formaram o Cia. Brasiliana de Energia e o controle integral da Eletropaulo passou à AES Brasil e a companhia passou então a se chamar AES Eletropaulo, negociando suas ações na BM&F Bovespa a partir de 2010.
A empresa de capital aberto tinha 49,58% das ações na mão de pequenos investidores e era negociada em bolsa, enquanto o BNDESPar tinha 18,73%, o grupo AES 16,84% e a União Federal outros 7,97% da empresa.
Em 2018, a AES Brasil vendeu o controle acionário da empresa à estatal italiana Enel Brasil, que venceu o leilão por cerca de R$ 5,5 bilhões por 73,38% das ações da companhia.
O negócio incluiu ainda uma oferta pública de ações do mercado que totalizou cerca de R$ 2,1 bilhões. Com isso, a Enel passou a deter 93,3% de todo o capital da AES Eletropaulo, num negócio estimado em mais de R$ 7,6 bilhões.
Assim, a partir de 03 de dezembro de 2018 passa a empresa passou a se chamar Enel Distribuição São Paulo.
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